As observações populares da natureza sobre plantas, animais e ventos podem indicar características da quadra invernosa que se aproxima no Ceará. No sítio Aroeiras, na zona rural de Orós, na região Centro-Sul, um grupo de agricultores participou do 4º Encontro dos Guardadores de Experiências Populares de Chuva e de Sementes no Sertão.
Encontro de guardadores de sementes e de experiências de chuva, no sítio Aroeira, zona rural de Orós. Foto: Wandemberg Belém
A iniciativa é do projeto Sertão Vivo e tem por objetivo manter a tradição, a memória dos antepassados que nos meses de dezembro e janeiro costumavam fazer previsões acerca do inverno.
O autor do projeto é o poeta e músico, Zé Vicente, que logo avisa: “Não é uma reunião de profetas, mas de guardadores de experiências populares, para manter viva a história, o costume do sertanejo”.
A maioria dos participantes acredita que no sertão haverá boas chuvas. O tempo permanece quente, não houve registro de precipitações na segunda quinzena de dezembro e nos primeiros dias deste janeiro.
“Teremos um inverno tardio, ma será muito bom”, disse o agricultor Antônio Alcântara, 78 anos, que desde criança acompanhava os avôs em suas experiências de previsão sobre as chuvas. Baseia-se no vento Aracati que sopra sobre o sertão vindo do litoral.
O agricultor Hélio Barros participa desde o terceiro encontro e entra logo na conversa. “A gente que anda pelo mato vê a formiga, o cupim e faz acertos e erros, mas digo que quando chove em novembro o inverno é desmantelado”, observou. “Neste ano, as chuvas só a partir de março”.
O agricultor e diretor do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Pedro Edimir Bezerra, solta um lamento profundo pela mudança dos tempos. “O homem desmatou muito, coloca veneno em tudo que é plantação, mata bichos e a natureza mudou”, frisou. “Não é mais como antes e isso prejudica as experiências que os nossos pais faziam”.
José Nilson Oliveira, agricultor, morador do distrito de Guassussê, acredita que ‘logo, logo, o inverno vai começar’. “A chuva chega já, já e muito forte”, disse. “Não há porque ficar preocupado e é só esperar um pouco mais que vai cair muito água”.
O músico Zé Vicente que mantém o projeto Sertão Vivo com encontros de agricultores, promovendo a arte e a cultura entre os moradores, oficinas de artesanato, de dança e de música, disse que o encontro dos agricultores visa à manutenção da linha da memória dos ancestrais. “Não podemos perder de vista o contato e a proteção da natureza”, disse. “No passado, os nossos pais e avôs olhavam para a natureza para plantar”.
Depois do relato de experiências, há um momento de troca de sementes crioulas, grãos não transgênicos, de milho, feijão e de outras espécies. “O nosso desafio é formar um banco de sementes nativas no futuro, preservando os grãos originários”, disse Zé Vicente, que neste ano trouxe sementes de uma espécie de feijão cultivado nos Andes peruano e outras no Rio Grande do Sul.
DN Foto: Wandemberg Belém
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