Alguns deputados e vereadores acumulam condenações que podem
impedir uma candidatura em 2014
A menos de um ano das eleições de 2014, alguns parlamentares
do Ceará já estão barrados no pleito do próximo ano ou ameaçados por ações que
tramitam em tribunais do Estado. Isso porque descumprem requisitos da Lei da
Ficha Limpa, que regulamenta casos de inelegibilidade. Cassações de mandatos,
condenações à prisão e ressarcimento aos cofres públicos são algumas das penas
aplicadas a esses políticos, que encontram brechas na legislação para se manter
em exercício parlamentar.
O deputado Carlomano Marques foi cassado pelo TRE no ano
passado e aguarda decisão do recurso que tramita no Tribunal Superior Eleitoral
Foto: José Leomar
De acordo com a Ficha Limpa, sancionada em 2010, são
considerados impedidos de lançar candidatura os réus que tiverem condenações transitadas
em julgado, que são aquelas sem mais direito a recursos, ou proferidas por
órgão judicial colegiado, da condenação até o prazo de oito anos após o
cumprimento da pena. A decisão monocrática - quando a sentença é assinada por
apenas um magistrado - não está incluída na legislação.
Na Assembleia Legislativa do Ceará, pelo menos dois
deputados encontram-se ameaçados de inelegibilidade: Neto Nunes e Carlomano
Marques. O primeiro foi condenado neste mês pela Justiça Federal por não ter
executado uma obra paga com recursos da Fundação Nacional de Saúde, referente
ao ano de 2003, quando ainda era prefeito do município do Icó. O valor não
utilizado soma R$ 98 mil e deveria ter sido aplicado no sistema de
abastecimento de água da cidade. Neto Nunes foi condenado à suspensão dos
direitos políticos por cinco anos e ressarcimento ao erário.
O deputado Carlomano Marques (PMDB) também está no rol dos
impedidos de concorrer em 2014. Em dezembro do ano passado, teve o mandato
cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE) por suposta compra de
votos nas eleições de 2010. A sentença ainda garante inelegibilidade por um
prazo de oito anos. Entretanto, o deputado recorreu ao Tribunal Superior
Eleitoral (TSE) e a ministra Laurita Vaz determinou a suspensão da cassação até
que o recurso do deputado seja julgado pela Corte Eleitoral.
Recursos
Sobre casos que envolvem recursos, o texto da Ficha Limpa
diz: o órgão "poderá, em caráter cautelar, suspender a inelegibilidade
sempre que existir plausibilidade da pretensão recursal e desde que a
providência tenha sido expressamente requerida, sob pena de preclusão
(impedimento), por ocasião da interposição do recurso". Como o deputado
recorreu solicitando a suspensão de todos os efeitos da sentença do TRE, a decisão
da ministra do TSE garante que, enquanto a Corte não apreciar o recurso, ele
fica isento da cassação, da inelegibilidade e da multa.
A Lei da Ficha Limpa também é clara em dizer que esse tipo
de processo deve ter prioridade de tramitação nos tribunais, mas não é o que
ocorre. Interposto em fevereiro deste ano, o recurso de Carlomano ainda não foi
apreciado pela Corte. Caso não haja julgamento até as eleições do próximo ano,
ele conseguirá se candidatar normalmente, já que a sentença do TRE está
suspensa. Se o Tribunal Superior confirmar a decisão do TRE, ele ainda poderá
recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF), alegando razões constitucionais.
Irmã de Carlomano Marques e envolvida no episódio que
culminou na cassação de mandato do deputado, a vereadora Magaly Marques (PMDB)
também foi considerada inelegível pelo TRE por um prazo de oito anos, além de
condenada à multa. Ela é acusada de oferecer consultas médicas em troca de
votos para o irmão, nas eleições de 2010. A denúncia foi ofertada pelo
Ministério Público Eleitoral.
Expedição de diploma
Magaly Marques entrou com um recurso no TSE para reverter a
decisão do TRE, mas o processo ainda está tramitando. Hoje, ela exerce mandato
na Câmara Municipal de Fortaleza, porque não teve o diploma cassado, mas é considerada
inelegível. Somente se o TSE reformar a sentença do Tribunal Regional
Eleitoral, ela poderá disputar eleições.
No ano passado, a Promotoria de Justiça da 2ª Zona Eleitoral
entrou com recurso contra a expedição do diploma da vereadora Magaly Marques,
eleita no pleito de 2012, por entender que a condenação dela no TRE configura
caso enquadrado pela Ficha Limpa. O recurso ainda está tramitando, mas o
parecer da Procuradoria da Corte é favorável à cassação do mandato da vereadora
do PMDB.
Um dos casos que chegaram a público recentemente é o do
vereador Márcio Cruz (PROS), condenado à prisão pelo Superior Tribunal Militar
(STM), sob a acusação de furtar 500 litros de óleo diesel à uma Lancha Patrulha
da Marinha. A notícia foi publicada pelo Diário do Nordeste na última
quarta-feira e revela que, mesmo com condenações que datavam de 2007, ele
conseguiu se candidatar sem quaisquer questionamentos do Ministério Público.
Registro de candidatura
A sentença do STM foi proferida em 2010 e confirmou a
decisão do Conselho de Justiça da Auditoria Militar em Fortaleza, da 10ª
Circunscrição Judiciária Militar (CJM), em 2007. Apesar de a sentença ter
passado despercebida em 2012, o vereador poderá ter o registro de candidatura
questionado nas próximas eleições, já que ele foi condenado por um órgão
colegiado.
O procurador regional eleitoral do Ceará, Rômulo Conrado,
explica que o Ministério Público Eleitoral está fazendo um levantamento dos
casos que poderão configurar impedimento de candidatura segundo a Ficha Limpa.
"Por enquanto, estamos mais na fase organizacional de identificar os
condenados. Como está com bastante antecedência, muita coisa pode mudar",
ressalta.
Questionado sobre algumas brechas, como o fato de o vereador
Márcio Cruz ter sido eleito sem qualquer impedimento, o procurador regional
eleitoral arrisca que Cruz não declarou, na certidão de candidatura, que havia
sido militar. "É bastante improvável que ele tenha apresentado isso na
certidão e não tenha sido impugnado", aponta.
Para o procurador Rômulo Conrado, ainda é cedo para fazer
uma avaliação da aplicação da Lei da Ficha da Limpa. Sancionada em 2010, ela só
entrou em vigência nas eleições do ano passado. "Essa é a primeira eleição
geral (2014) em que ela será aplicada, vai ser o grande teste da lei, até para
saber se os tribunais vão manter as leis em seus termos". E completa:
"Eu espero que o TSE adote alguma medida de efeito para que se chegue a
uma eleição tendo encerrado os processos da outra".
O suplente de deputado estadual Perboyre Diógenes, que
chegou a assumir vaga na Assembleia Legislativa neste ano, também é considerado
"ficha suja". Em junho último, o parlamentar foi condenado pelo 5º
Tribunal Regional Federal (TRF) a quatro anos e seis meses de reclusão, por
irregularidades em convênio de R$ 320 mil entre a Prefeitura de Saboeiro e a
Fundação Nacional de Saúde. Os recursos deveriam ter sido aplicados na
construção de kits sanitários, quando ele era prefeito da cidade, o que não
ocorreu.
No ano passado, Perboyre já havia tido a candidatura
impugnada na Justiça Eleitoral ao tentar disputar a vaga de prefeito de
Saboeiro. O impedimento decorreu de contas desaprovadas pelo Tribunal de Contas
dos Municípios do Ceará (TCM) e da União (TCU), referentes ao período em que
ele comandava a prefeitura daquele município.
Ações judiciais
Além dos episódios que efetivamente culminaram em
condenações, outros parlamentares, mesmo sem uma sentença já definida, estão
envolvidos em ações judiciais. Em junho de 2013, o Ministério Público ofereceu
uma denúncia contra o deputado Osmar Baquit (PSD) por suposto envolvimento em
ataques a rádios e a uma emissora de TV no município de Quixadá. O parlamentar
será julgado pelo Tribunal de Justiça do Ceará.
Segundo informações do site Transparência Brasil, pelo menos
doze dos 22 deputados federais do Ceará já tiveram ocorrências na Justiça ou
nos Tribunais de Contas. São eles Aníbal Gomes, Danilo Forte, Mário Feitoza,
Gorete Pereira, Antonio Balhmann, Ariosto Holanda, Manoel Salviano, Raimundo
Gomes de Matos, José Airton, José Guimarães, Arnon Bezerra e Genecias Noronha.
Em novembro de 2012, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
determinou, através da Meta 18, que os tribunais de Justiça estaduais julgassem,
até o final deste ano, todos os processos de improbidade administrativa - ações
que respondem por irregularidades na gestão pública - impetradas até dezembro
de 2011.
No Ceará, o grupo especial formado para apreciar esses
processos examinou 1.151 ações, com 545 despachos, 62 decisões, 237 sentenças e
307 exclusões. O Tribunal de Justiça do Ceará não soube informar quantas
configuram condenações.
DIÁRIO DO NORDESTE / LORENA ALVES (REPÓRTER)
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