A chuva faz parte do imaginário
do povo nordestino, característica expressa em diversas manifestações, tanto
artísticas quanto em tradições orais, que passam de pais para filhos, a exemplo
da realização de previsões para saber como será a quadra chuvosa de cada ano.
Assim como a Fundação Cearense de
Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme) realiza estudos para identificar
como será o comportamento da próxima quadra chuvosa, a última foi divulgada dia
18, apontando maior probabilidade de chuva abaixo da média nos meses de
janeiro, fevereiro e março de 2015, homens e mulheres anônimos do sertão fazem
também as suas previsões.
O momento ainda é de incerteza
quanto à projeção para o desempenho da quadra chuvosa do próximo ano, admitem
os pesquisadores da Instituição. No entanto, os modelos pesquisados sinalizam
para o percentual de 55% para chuvas abaixo da média; 30% na média; e 15% acima
da média, respectivamente.
O estudo não corresponde ao
desempenho da totalidade quadra chuvosa do Ceará, que ocorre entre os meses de
fevereiro e maio de cada ano. A Funceme ressalva que a divulgação do
prognóstico para 2015 só acontecerá na segunda quinzena de janeiro, adiantando
que o acumulando de chuva do período poderá ficar abaixo dos 412 milímetros
previstos.
O quadro atual de estiagem, caso
continue em 2015, fechará o ciclo de cinco anos. Diante da gravidade da
situação a Funceme passou a divulgar as previsões climáticas mensais.
O objetivo é orientar ações
governamentais e informar a sociedade, de acordo com informações da Assessoria
de Comunicação da Funceme. Os dados projetam o total de chuva que poderá
ocorrer no período de janeiro a março do próximo ano.
No entanto, destaca que a
previsão não corresponde ainda ao prognóstico da estação chuvosa, justificando
se tratar de período diferente.
As condições dos oceanos Pacífico
e Atlântico foram determinantes para a conclusão da pesquisa, que mostra
tendência desfavorável à chuva.
O Pacífico Equatorial permanece
aquecido, indicando que o El Niño está em atuação. Enquanto no Atlântico
Equatorial é observada a configuração de diferença de temperaturas, o que
significa atuação mais regular da zona de convergência intertropical (Zcit).
Trata-se de sistema meteorológico
que começa a atuar na segunda quinzena de fevereiro, considerado como um dos
responsáveis pelo desempenho de chuva durante a quadra chuviosa no Ceará.
Fé
Ancorados na fé, sobretudo em
três santos - Santa Luzia, São Sebastião e São José - , muitos agricultores
tentam antever como será o inverno do próximo ano. As rezas e as promessas
começam no mês de dezembro, conforme a letra da música "A triste
partida", poesia de Patativa do Assaré (1909-2002), conhecida na voz de
Luiz Gonzaga (1912-1989).
Seguindo os relatos de alguns
agricultores da região do sertão de Canindé, uma das áreas mais castigadas pela
estiagem, é possível observar que as previsões dos chamados "profetas
populares" se aproximam do discurso científico, materializado nos
prognósticos da Funceme.
Alguns afirmam que o inverno não
será nem ruim, nem bom, apostando que irá chover apenas nos meses de janeiro,
fevereiro e março, como afirmou a agricultora Maria Teresa da Silva, natural de
Caridade. Recomenda que as pessoas guardem água, porque o tempo de chuva será
curto.
Enquanto outros preferem
"ler" alguns sinais da natureza, traduzidos na localização da casa do
pássaro João de Barro, sinalizando que o sertão terá chuva em 2015, a entrada
ficou virada para o lado do poente.
Outro sinal de inverno
identificado pelos agricultores é o "trabalho" das formigas. Ou seja,
elas já começaram a juntar alimentos, o que significa sinal de inverno.
A agricultora Teresa Ramos de
Sousa atenta para 2015, quando completam-se 100 anos da seca de 1915. Será o
inverso, um ano de muita chuva e fartura, projeta.
As pedrinhas de sal, adivinhação
feita da noite do dia 12 para 13 de dezembro, dia de Santa Luzia, indicam ano
de chuva, conforme previsão do agricultor Ademário Ferreira da Silva, de
Canindé.
Somente o mês de maio não ficou
molhado, revela. A adivinhação, que consiste em deixar ao relento seis
pedrinhas de sal, correspondendo ao primeiro semestre do ano, abre o calendário
dos santos que intercedem para um bom inverno.
Na sequência, aparecem São
Sebastião, 20 de janeiro, quando os sertanejos fazem novas orações e promessas.
Para fechar o ciclo, São José, santo festejado em todo o sertão, no dia 19 de
março, a última esperança dos agricultores.
A região Nordeste apresenta desde
a colonização do Brasil registros de secas ou estiagens, já que possui cerca de
53% de sua área localizada no Semiárido. Situação peculiar ao Ceará, possui
mais de 90% de suas terras encravadas na região semiárida ou sertão, fazendo
com que sua população esteja exposta a períodos cíclicos de estiagens, como o
que vive no momento, iniciado há quatro anos, sendo considerado um dos piores
dos últimos 60 anos.
Enchentes, estiagens mais
severas, invernos e verões rigorosos materializam os prognósticos científicos
cujas perspectivas para as regiões semiáridas são desfavoráveis, levando a crer
que os efeitos das mudanças climáticas são percebidos ano a ano.
DIÁRIO DO NORDESTE - Iracema
Sales – Repórter FOTO: JOSÉ LEOMAR
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