A Polícia Federal (PF) realizou ontem operação contra três
grupos suspeitos de desviar R$ 5,7 bilhões da Receita Federal. Segundo a PF, o
prejuízo pode chegar a R$ 19 bilhões. Dentre os investigados pelo órgão está um
cearense com participação no Conselho de Administração de Recursos Fiscais
(Carf) do Ministério da Fazenda, em Brasília, onde o esquema ocorria. Ele tem
residência em Juazeiro do Norte, no bairro Lagoa seca, considerado região nobre
do município, conforme O POVO apurou. O escândalo revelado pela operação pode
se tornar maior que a Lava Jato, que movimentou R$ 10 bilhões.
Para descobrir se o cearense está envolvido, dezessete
agentes da PF e dois da RF cumpriram mandado de busca e apreensão na residência
do investigado. Foram recolhidos computadores, notebooks, HD externo e
documentos. O caso está em sigilo de Justiça e o nome do suspeito não foi
revelado.
O Carf é órgão do Ministério da Fazenda que realiza
julgamento de recursos administrativos de autuação promovidos pela Receita. O
esquema envolvia servidores da própria Receita, nomeados como conselheiros do
órgão, cargo que exercem por três anos. Também escritórios de consultoria,
assessoria e advocacia. O objetivo da corrupção era anular ou diminuir o valor
das multas aplicadas pela Receita em troca de propina de até 10% do valor das
autuações.
Segundo a PF, os envolvidos repassavam informações
privilegiadas para os escritórios para captar clientes e oferecer facilidades
no órgão da Receita. Eles devem responder por crime de advocacia administrativa
fazendária, tráfico de influência, corrupção passiva e ativa, associação
criminosa, organização criminosa e lavagem de dinheiro. As penas somadas podem
chegar a mais de 50 anos de prisão.
“Nós percebemos que havia uma questão endêmica para fazer o
patrocínio de interesses privados se utilizando de servidores públicos”, disse
Marlon Oliveira Cajado, coordenador da Operação Zelotes. “Eles usavam a
consultoria que tinham para lavar o dinheiro de alguma forma e depois sacavam e
faziam a distribuição dos valores que tinham obtido”. A corregedora-geral do
Ministério da Fazenda, Fabiana Lima, afirmou que vai pedir a nulidade das ações
onde foram encontradas irregularidades.
Foram expedidos 41 mandados de busca e apreensão em Brasília,
São Paulo e Juazeiro do Norte, que são cumpridos por 180 policiais federais e
mais 55 fiscais da RF. As investigações iniciaram no final de 2013, quando foi
percebida a manipulação de funcionários nos resultados de julgamentos das
multas junto ao Carf.
Há indícios de que os casos ocorrem desde 2005 e nove
ex-conselheiros e um atual estão entre os suspeitos de participar do esquema.
Pelo menos 70 empresas dos ramos bancário, siderúrgico, automobilístico e da
construção civil participaram da fraude.
Frederico de Carvalho, procurador da República e chefe do
Núcleo de Combate à Corrupção, explica que os conselheiros do Carf vêm de todo
o Brasil e são indicados pelas Confederações de Comércio, Transporte e
Indústria. “A Polícia (Federal) suspeitou de servidores se encontrando com
advogados das empresas e a investigação surgiu”, diz. “Ao contrário da Operação
Lava Jato, o juiz decretou sigilo da Zelotes. Eu acho que a sociedade merece
saber o que está sendo investigado”, disse ao O POVO.
O que é Carf
Carf julga processos na esfera administrativa, em que
contribuintes questionam a cobrança de tributos. É um colegiado paritário
formado por funcionários do Ministério da Fazenda e por representantes da
sociedade, como advogados. Ele é composto por três seções de julgamento, cada
uma especializada em um grupo de tributos.
Saiba mais
Para se ter uma ideia do que representam os R$ 19 bilhões
estimados em prejuízo aos cofres públicos, o valor é quase o mesmo destinado ao
programa Minha Casa, Minha Vida neste ano (R$ 19,3 bilhões). O orçamento do
Governo do Estado do Ceará para todo o ano de 2015 é de R$ 23,6 bilhões. Ao
programa Bolsa Família, o Governo Federal prevê R$ 27,1 bilhões. Os desvios da
operação Lava Jato são estimados em R$ 10 bilhões.
O termo Zelotes, tem como significado o falso zelo ou cuidado
fingido. Refere-se a alguns conselheiros julgadores que não estariam atuando
com o zelo e a imparcialidade necessários.
O POVO
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