Iguatu Três anos seguidos de chuva abaixo da média com risco
de prolongamento na atual quadra invernosa, no sertão cearense, traz prejuízos
enormes para a economia agrícola, gerando empobrecimento no campo. Entretanto,
a seca também traz bons lucros para empresas de perfuração de poços profundos e
proprietários de caminhões-pipa. A demanda por esses serviços vêm crescendo de
forma intensa e deve permanecer ascendente ao longo do ano.
Historicamente, sempre houve quem ganhasse com a estiagem no
sertão cearense. Durante décadas, era comum o uso da expressão "a
indústria da seca". No passado, fornecedores de grãos de péssima qualidade,
apontadores de grupos de trabalhadores, alistamentos fantasmas de agricultores,
líderes políticos locais obtinham ganhos eleitorais e materiais. As ações de
enfrentamento à seca mudaram a partir do fim dos anos de 1980, eliminando as
tradicionais frentes de serviço.
No contexto atual, empresas de construção civil e prestadoras
de serviços para o Estado e para particulares lucram com o aumento da demanda
por instalação de sistemas simplificados de abastecimento de água, perfuração
de poços, instalação de rede de energia elétrica, venda de materiais elétricos,
e hidráulicos.
Os exemplos são múltiplos, mas sobressaem-se duas atividades:
a locação de carros-pipa e a perfuração de poços profundos. A demanda por busca
de água subterrânea aumentou significativamente. Estima-se que, antes de 2010,
havia dez empresas especializadas atuando no Ceará. Hoje são cerca de 30.
Não há, entretanto, dados sobre a quantidade de poços
contratados por particulares, perfurados para produtores rurais e empresários
urbanos durante o período de estiagem que castiga o Ceará. "Imagino que,
em 2013 e 2014, foram perfurados cinco vezes mais do que em 2012", estima
o empresário, Michael Delano, da Dana Poços.
O geólogo Joaquim Feitosa disse que antes do atual ciclo de
seca poucos produtores rurais e empresários mostravam interesse por perfuração
de poços profundos. "A necessidade despertou entre o governo, agricultores
e empresários a importância da busca de água subterrânea", frisou Feitosa.
"Muitos viram que não podiam ficar dependentes de carro-pipa, de pequenos
barreiros que secam ou dos sistemas locais de abastecimento de água",
afirma.
De acordo com Michael Delano, 80% da demanda são oriundos de
produtores rurais e 20% de empresas e moradores de área urbana. Em média, o
metro de um poço perfurado em solo cristalino custa R$ 100,00 e terreno
sedimentar (aluvião), R$ 80,00. O estudo geofísico para alocação está em torno
de R$ 1,000,00. O preço médio do poço instalado é R$ 12 mil.
O custo médio de uma cisterna de placa é estimado em R$ 18
mil. O de construção de um barreiro é bem superior. "O poço oferta água de
qualidade, abastece famílias, carros-pipa e tem maior tempo de uso do que uma
cisterna", observa Michael Delano. O geólogo Joaquim Feitosa destaca que
dezenas de empresas de Minas Gerais, Pernambuco, Bahia, Pernambuco estão
trabalhando no Ceará. O lucro estimado por poço é de 50%. "A maior parte
dos recursos não fica aqui, no Estado", frisou.
No Centro do Estado, quem também está lucrando com a seca é o
empresário Francisco das Chagas Cândido Costa, mais conhecido como
"Ticão". Há mais de 15 anos ele se dedica ao ramo de perfuração de
poços na região. Após não obter muito sucesso no comércio farmacêutico, aceitou
o convite do cunhado e sócio, Francisco de Assis Capistrano, que é geólogo.
Eles investiram R$ 600 mil na compra dos equipamentos e não pararam mais de
trabalhar.
"Ticão" não revela o lucro da sua empresa, a LA
Serviços de Perfurações, mas garante ter ocorrido um aumento substancial com a
estiagem prolongada dos últimos anos. Antes de o quadro se agravar na região,
da maioria dos açudes secarem, eles perfuravam, em média, 30 poços artesianos
num mês. Agora a demanda chega a 60 poços, e tem gente aguardando na fila.
Conforme o empresário, o tempo médio para a perfuração de um
poço é de 5 horas. O custo é de R$ 100,00 por metro linear. A água acaba sendo
encontrada numa profundidade de 60 a 80 metros. O gasto do cliente chega em
torno R$ 8.000,00 somente na perfuração, mas quem prefere o serviço completo,
incluindo a bomba e a rede elétrica, o custo chega a R$ 15 mil. Os interessados
podem procurar financiamento no Banco do Nordeste do Brasil (BNB), apesar de
haver demora de até 60 dias para liberação do dinheiro, acrescenta.
Carros-pipa
A seca, apesar de seus efeitos negativos, acabou por
contribuir para mostrar ao governo e aos proprietários rurais que o Ceará tem
água subterrânea e de qualidade. "Muitos afirmavam que, por ter 80% do
solo cristalino, não era viável programa de perfuração de poços no Estado",
disse Feitosa. "O índice de acerto tem sido bom e os exemplos de vazão de
10 a 20 mil litros por hora ou mais crescem a cada semana nas regiões do Sertão
Central, Inhamuns e Sertões de Crateús". Em vez de barreiros, os
produtores rurais estão agora investindo em poços.
Os donos de carros-pipa também estão lucrando com a seca. O
aumento da demanda por esse serviço, contratado pelo Exército e por meio da
Defesa Civil do Estado, movimentou ainda mais os negócios e incentivou a compra
ou adequação dos veículos. Os motoristas também ganham com a oportunidadede
emprego. Os pipeiros preferem não revelar valores, que dizem que depende de
cada rota. "Se não fosse a seca, estaria sem trabalho", disse
Francisco Lima, motorista de um caminhão-pipa que diariamente abastece famílias
no sertão da Paraíba, mas que vem fazer a coleta de água no Açude Lima Campos,
em Icó, no Ceará. "O negócio deixa uns R$ 3 mil".
Radiestesia
Acostumado a indicar locais favoráveis para água subterrânea
utilizando apenas uma vareta de madeira e um pêndulo, o técnico em
Agropecuária, Rivaldo Leite, 56, conhecido como "Seu Menino", está
feliz com o número de clientes à procura das suas habilidades com sua técnica,
uma pseudociência conhecida como Radiestesia.
Apesar de angustiado com o prolongamento da estiagem no
Nordeste, para ele o período está sendo de "vacas gordas". Ao longo
de mais de 20 anos dedicados a essa atividade nunca foi tão procurado.
Para quem recebe vencimentos mensais de R$ 1.200,00 da
Prefeitura de Quixadá na função de titular da Coordenadoria de Defesa Civil do
Município, suas habilidades em Radiestesia estão auxiliando significativamente
no orçamento familiar. O serviço custa R$ 700,00. Do início de 2014 até ontem,
ele já indicou mais de 50 poços, em vários municípios do Ceará e até no Rio
Grande do Norte.
Se por um lado "Seu Menino" está triste com a seca
estendida nos três últimos anos, por outro está feliz em poder trazer do
subsolo o alívio para muita gente. Ele garante acerto de 90% nas suas análises.
Além de definir a profundidade das fendas ainda dá o
diagnóstico da qualidade da água. Por conta dos resultados, enquanto as chuvas
não voltam a banhar com abundância o Estado, a lista de pedidos na sua agenda
só aumenta. "Às vezes a alegria vem para alguns nos momentos mais difíceis
para outros. Se recebi esse dom, tenho que aproveitá-lo", ressalta.
Nos últimos 12 meses, além de Quixadá, "Seu Menino"
realizou trabalhos com sua técnica nos municípios de Quixeramobim, Madalena,
Ocara, Banabuiú, Morada Nova, Guaiuba, Maranguape, Caucaia, e Cascavel. Ainda
segundo o radiestesista, a Prefeitura de Ibicuitinga lhe contratou para indicar
o local de perfuração de 27 poços.
Mas foi em Boa Viagem que encontrou o seu mais recente
desafio. Após o proprietário de uma fazenda, na localidade de Pedra da Guia,
situada a pouco mais de 15Km do Centro da cidade gastar com a perfuração de 10
poços, sem encontrar água, contratando uma empresa com geólogo, por exigência
do Banco do Nordeste do Brasil (BNB), foi nas mãos dele, indicando o local do
11º poço que o fazendeiro acabou encontrando água. "O poço deu vazão de 10
mil litros por hora e a água é boa", comentou feliz.
DIÁRIO DO NORDESTE - Honório Barbosa/ Alex Pimentel Colaboradores
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