Oroense Edson Cândido |
Quando o autor Plínio Marcos escreveu o texto da peça
"Navalha na Carne", a paisagem da cracolândia no Centro de São Paulo
e seus personagens foram traduzidos de forma dramática para os palcos do
teatro.
Da mesma forma, as imagens urbanas e as vivências do escritor
Qorpo Santo, em Porto Alegre e em Triunfo, sua cidade natal, foram decisivas na
produção de seus escritos.
Buscando percorrer esses ambientes de referência para o
dramaturgo, os cearenses do Grupo Imagens de Teatro - cujo repertório está
intimamente ligado ao trabalho de Plínio Marcos - viajam na próxima semana para
as duas cidades, a fim de realizar de apresentações e entrar em um processo
ainda mais aprofundado de imersão.
Na capital paulista, o grupo exibirá sua adaptação do
"Navalha na Carne" nos dias 10 e 11 de abril, na sede do grupo
Pequeno Teatro de Torneado, localizada no centro da cidade e próxima a regiões
ocupadas por usuários de drogas, também conhecida como Boca do lixo.
"No tempos do Plínio, a cracolândia era bem maior. Mesmo
com a tentativa da Prefeitura de São Paulo de 'higienizar' o local, essas
pessoas se espalharam e abriram o leque territorial de possibilidades",
diz Edson Cândido, diretor do grupo, que morou durante anos na cidade paulista.
"Essa problemática do submundo, ou das 'quebradas do
mundárel' - como classificava Plínio Marcos -, é o foco principal do nosso
trabalho enquanto grupo de teatro", afirma Edson.
A fim de imergir ainda mais no teatro marginal de Plínio
Marcos (1935-1999) e Qorpo Santo (1829-1883), que já faz parte do repertório do
grupo, o Imagens de Teatro viaja para São Paulo e Rio Grande do Sul, terras
natais dos dramaturgos.
A viagem para a capital paulista faz parte de um intercâmbio
cultural entre o Grupo Imagens e o Pequeno Teatro de Torneado. "Nós nos
conhecemos em outros festivais e conversamos até chegarmos a essa decisão. A
região da cracolândia também é objeto de estudo e análise do Pequeno
Teatro", ressalta Edson, não escondendo a ansiedade para o início da
temporada de apresentações.
Já no Rio Grande do Sul, o grupo o espetáculo "Dr
Qorpo", montagem que conta a história do escritor Qorpo Santo, que fará
parte da programação de festival que homenageia o autor. "São dois momentos
muito especiais, já que vamos nos apresentar no habitat natural dos dois
autores que mais influenciam o nosso repertório, e essa chance para nós que
pesquisamos e estudamos suas obras é valiosíssima. No Rio Grande do Sul, por
exemplo, vamos ter a oportunidade de conhecer alguns parentes de Qorpo Santo e
de visitar a casa onde ele morou", detalha o diretor.
Antes de embarcar para São Paulo, o grupo realiza
apresentações em Fortaleza dos espetáculos "Navalha na Carne" e
"Dr Qorpo", nos dias 4 e 5 de abril, no Theatro José de Alencar.
Circulação
Ainda faz parte dos planos do grupo a produção de um
documentário, sem previsão para lançamento, durante as passagens nas duas
cidades.
"Uma equipe de profissionais vai nos acompanhar durante
todo o período em que vamos explorar as cidades dos dois autores".
Para o diretor, a viagem não é apenas uma forma de subir em
outros palcos, mas também de capacitação. "Acredito que, com essas
vivências, vamos colher frutos bem maiores". Curiosamente, as viagens
foram financiadas, em parte, pela Plataforma de Circulação de Música e Arte,
projeto de iniciativa da Fundação Amigos do Theatro José de Alencar. O grupo
fora selecionado para participar da Plataforma e decidiu reverter o cachê em
prol dessa imersão.
Montagem
Em paralelo às apresentações e vivências, o grupo prepara
também mais uma adaptação de texto de Plínio Marcos. Já está em fase de
produção o espetáculo "Mancha Roxa", que trata com um olhar crítico a
questão carcerária feminina.
Para aprofundar a reflexão acerca do tema, o grupo realizou
uma roda de conversas com a escritora e jornalista Aline Moura, uma das autoras
do livro "Auri, a anfitriã", em que narra história do Instituto Penal
Feminino Desembargador Auri Moura Costa.
A preferência pelo autor paulista se dá pelas afinidades
ideológicas do grupo, que acredita na produção de um teatro político e
denunciador.
"Nós levantamos as mesmas bandeiras que o Plínio
Marcos", afirma o diretor da trupe. A familiaridade com os ambientes marginais
que permeiam a dramaturgia de Plínio vem da história pessoal de cada ator e
também da localização da sede do grupo, que fica na divisa dos bairros Monte
Castelo e Ellery, regiões com alto índice de violência.
Outra questão que aproximou o grupo à obra de Plínio Marcos é
a possibilidade de os textos serem apresentados em espaços alternativos.
"As peças dele não precisam de grandes produções para
acontecerem. Com temas polêmicos, ele escreveu para que sua obra fosse
apresentada em espaços pouco convencionais, como um mercado, um bar ou um
cabaré", afirma Edson.
Mais informações:
Mostra Maldita, no Theatro José de Alencar (Rua Liberato
Barroso, 525, Centro), com o grupo Imagens de Teatro. Apresentação dos
espetáculos Dr Qorpo (4) e Navalha na Carne (5), ambas às 19h. Ingressos: R$20
(inteira) e R$10 (meia). Contato: (85) 9718.5506.
DIÁRIO DO NORDESTE - Leonardo Bezerra Repórter
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