Uma mulher gestante entrou na Justiça do Ceará, alegando o
direito à interrupção de gravidez quando há risco de morte, como prevê o Código
Penal Brasileiro. O procedimento foi autorizado pelo juiz Edísio Meira Tejo
Neto, que responde atualmente pela 2ª Vara de Maranguape (Região Metropolitana
de Fortaleza), mas o promotor público Marcus Vinícius Nascimento, respondendo
pela 2ª Vara de Maranguape, recorreu da decisão.
A gestante descobriu na 19ª semana de gestação que o feto
estava com Síndrome de Patau - doença que acarreta malformações morfológicas
múltiplas, em que 45% das crianças morrem antes do primeiro mês de vida. Na
ocasião, a mulher teria sido informada pelo médico que, devido ao problema, o
feto estaria se decompondo no saco uterino.
De acordo o juiz, trata-se de um caso raro, uma vez que as
malformações ocasionadas pela síndrome causam em 95% dos casos abortos
espontâneos, ou então as mulheres conseguem realizar o aborto sem que seja
necessário entrar na Justiça.
O aborto legal é permitido no Brasil quando a gravidez é
ocasionada por um estupro ou se a vida da mulher está posta em risco pela
gravidez. Mais recentemente, o Superior Tribunal Federal (STF) decidiu que o
aborto também é permitido quando se trata de fetos anencéfalos. "Essa
decisão do STF abre para os juízes a possibilidade de que em casos semelhantes,
em que as chances de sobrevida do feto são mínimas, possamos decidir pela
interrupção", explica o magistrado, apontando que pelos laudos médicos
apresentados pela requerente da ação que a manutenção da gestação poderia
levá-la ao óbito.
Para o promotor, no entanto, os laudos médicos apresentados
são inconclusivos, e o caso da requerente não se encaixa em nenhuma das três
possibilidades legais. "O caso seria de um aborto eugênico, em que a
gestante, por conta de uma síndrome, requer a interrupção, alegando danos
psicológicos, e isso não está previsto (no Código Penal)", aponta
Nascimento.
Meira diz que amparou sua decisão em parecer favorável à
interrupção da gravidez dado pelo Conselho Regional de Medicina do Ceará, que
teria informado que a "preservação da gravidez acarretaria no possível
desenvolvimento de pré-eclâmpsia, infecções generalizadas e complicações na
saúde psíquica da mulher, além do risco de morte dela".
"Não autorizar seria forçar a gestante a conduzir um
feto malformado e sem expectativa de vida, e gerar pra mãe o sentimento de
tortura constante, que poderia trazer transtornos psíquicos grandes. E no caso
de uma infecção, ou perda do útero, impossibilitá-la de engravidar
novamente", pondera o juiz.
Questionado quanto a possível polêmica de sua decisão, uma
vez que o aborto e temas correlacionados estão em pauta no Poder Legislativo nacional
e alguns grupos religiosos condenam a prática sob qualquer circunstância, o
juiz afirmou que foi estudada profundamente e se ampara legalmente. Em sua
sentença, o juiz destacou que "diante desse cenário, tenho que nossa
sociedade – democrática, e fundada no postulado da dignidade da pessoa humana –
não pode exigir da gestante conduta outra que não a interrupção da gravidez,
justamente em razão de ser premente a existência de agravamento dos riscos à
sua vida caso mantida a gestação".
O promotor recorreu da decisão no mesmo dia em que foi
proferida, no dia 7 deste mês, e disse esperar que a decisão do juiz passe pelo
crivo de um colegiado do Tribunal do Justiça.
O POVO
Nenhum comentário:
Postar um comentário