“Clã político é um tipo de organização parecida com a máfia:
alimenta-se da formalidade do processo politico para controlar disputa em
determinado lugar”, destaca o doutor em Ciências Políticas Venuccio Pimentel.
Para ele, este tipo de estrutura, que concentra o poder em laços familiares e
afetuosos, faz parte da cultura política do Ceará. Os chamados clãs políticos
comandam pelo menos 83 prefeituras no Estado - 45% do total de municípios. Os
dados são de 2013, primeiro ano de mandato dos atuais gestores.
Em sua tese de doutorado “A primazia dos clãs: a família na
política nordestina”, Pimentel colheu dados de 1.500 municípios do Nordeste e
descobriu que 43% deles possuem um ou mais parentes de prefeitos como
secretários das principais pastas: saúde, educação e assistência social. “O
percentual real certamente é muito maior que isso, se levar em conta todas as
secretarias. Na pesquisa, elenquei apenas as três às quais tive acesso por meio
de arquivos públicos”, explica.
Neste levantamento, Pimentel considerou como clã político um
grupo em que o prefeito nomeia um ou mais parentes como titular de uma das
secretarias mais importantes. Em geral, as três pastas são as contempladas com
o maior volume de recursos nos municípios. O pesquisador analisa que essa é uma
forma de controle que transforma “a coisa pública em particular”.
“É importante destacar que exclui da pesquisa o que chamamos
de filhotismo, que é quando um filho segue a carreira do pai. Isso ocorre em
qualquer profissão, como médico ou advogado, não só na política. Então esse
tipo de relação ficou de fora”, esclarece Pimentel.
Ao longo da história do Brasil, governos centralizadores,
como Getúlio Vargas (1937-1945) e o regime militar (1964 – 1985), tentaram
quebrar as estruturas familiares. Mas elas prevaleceram, especialmente, nos
micro e pequenos municípios. O estudo, publicado pela Universidade Federal de
Pernambuco (UFPE), aponta que a força e incidência dos clãs políticos é menor
em lugares onde o multipartidarismo está mais presente, como ocorre nas
capitais.
“Não existem pesquisas para dizermos se os clãs têm efeitos
positivos ou negativos nos municípios. No mínimo, essa prática é
antirrepublicana. Se é imoral ou antiética, depende do julgamento de cada
cidadão”, argumenta. Ele tem expectativa de que a tese, que vai virar livro
ainda neste ano, inspire novas pesquisas sobre o tema.
Evolução
Para o cientista político Francisco Waston, o conceito de clã
político tem origem tão antiga quanto o Império Romano. Com o passar dos
séculos, no entanto, ele ganhou cara nova. “Para mim, isso é um coronelismo
aperfeiçoado”, afirma. Segundo ele, o sistema se retroalimenta porque o
contexto social favorece a prática, sobretudo no Nordeste.
“Nossa população continua analfabeta e cheia de dificuldades
e os políticos tiram proveito disso da forma que podem. Para piorar, é tudo
dentro da lei, já que nomear secretários da família é permitido”, argumenta.
Waston lembra, no entanto, que a legislação brasileira criou
mecanismos para dificultar esse tipo de estrutura. “Antes, os repasses vinham
da União para o Estado, e do Estado para os municípios. Eles eram obrigados a
ter alianças para receber as verbas. A coisas melhoraram desde a Constituição
de 1988”, avalia.
Fonte: Diário do Nordeste
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