Um dos principais elementos utilizados pelos
investigadores para identificar os mais de 40 policiais militares, ex-policiais
e seguranças nas ruas dos bairros Curió e São Miguel, onde ocorreu a Chacina da
Messejana, foi o levantamento sobre o uso dos aparelhos celulares dos suspeitos
na noite do dia 11 e a madrugada do dia 12 de novembro do ano passado. O
levantamento e checagem da utilização das antenas da rede de telefonia móvel,
identificadas como Estações Rádio Base (ERBs), mostraram que PMs de serviço,
outros de folga e os demais suspeitos estavam na hora das execuções, durante a
madrugada, naquela região da cidade. Policiais civis não teriam participado do
episódio.
A reportagem obteve esse e outros detalhes
com uma fonte da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) que
acompanha o caso. A maior chacina já registrada na Capital cearense, que deixou
11 mortos e sete feridos, completa cinco meses amanhã. "Policiais
militares de outras Companhias e Batalhões, não só da 1ª Cia do 16º BPM (Messejana),
se reuniram na praça do Curió naquela noite (11/11/2015). Ex-policiais e
segurança também estavam lá. Eram mais de 50, com certeza", disse o
servidor da SSPDS.
No entanto, a dificuldade maior encontrada
pela Delegacia de Assuntos Internos (DAI), da Controladoria Geral de Disciplina
dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário (CGD), ainda é saber
quantos deram apoio e quantos "puxaram o gatilho", efetivamente.
As análises periciais feitas pela Polícia
Federal (PF) e Perícia Forense (Pefoce), com os projéteis encontrados nos
locais dos crimes, podem não ajudar a elucidar de quais armas partiram os
tiros, conforme revelou a fonte. "Podemos dizer que quase todas as armas
que foram usadas (na chacina) eram ilegais (sem registro). Ninguém usa a
própria arma (registrada) em uma situação dessa", disse o servidor.
Mesmo sem essa confirmação, a operação para
prender os suspeitos e apreender objetos como armas e aparelhos celulares, já
estaria sendo montada pela CGD e o Ministério Público do Ceará (MPCE). O MP
ficará responsável por solicitar à Justiça os mandados de prisão temporária e
de busca e apreensão.
Alguns dos policiais militares suspeitos já
estariam esperando o momento em que serão conduzidos. A deflagração da operação
é tratada com preocupação por oficiais da PM ouvidos pelo jornal, que temem uma
"greve branca" da Corporação em represália às prisões.
Revolta
A fonte da SSPDS revelou que os PMs da área
já estavam revoltados por conta de um episódio ocorrido cerca de uma semana
antes da chacina quando um policial militar foi expulso do Curió por
traficantes. Os criminosos teriam descoberto que o PM estaria por trás do
homicídio de um adolescente ligado a venda de entorpecentes.
Uma semana depois desse fato, por volta das
21 horas do dia 11 de novembro do ano passado, o soldado Valtemberg Charles
Serpa, é morto com um tiro em uma tentativa de assalto à mulher dele, no bairro
Lagoa Redonda. Após a morte do soldado, "os colegas de farda começaram a
se articular".
Conforme revelou a fonte, os policiais de
serviço naquele dia pouco usaram os rádios das viaturas pois sabiam que seriam
gravados pela Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança (Ciops). Mesmo
assim, áudios das conversas das viaturas e o posicionamento dos veículos oficiais
daquela área na noite do crime foram enviadas à Controladoria Geral de
Disciplina.
Aplicativo
A convocação inicial para uma eventual
"resposta" a morte de Valtemberg, assim como a maior parte das
comunicações sobre os "alvos" a serem eliminados foi feita pelo
aplicativo para smartphone Zello. Pelo programa, em um grupo formado apenas por
praças da PM (soldados, cabos, sargentos e sub tenentes), as informações eram
compartilhadas rapidamente.
O ponto de encontro foi uma praça no Curió.
Dali, portando pistolas e revólveres, a maioria das armas sem registro, os
homens saíram em carros particulares para os locais previamente combinados
naquele bairro e em ruas do Conjunto São Miguel, bem perto dali. O objetivo,
segundo apurou a reportagem, seria matar dez pessoas envolvidas com o tráfico e
também os responsáveis pelo assalto que matou Valtemberg.
"Os policiais da área sabiam onde os
criminosos daquelas comunidades moravam. Então eles saíram caçando quem era
bandido, com o objetivo de vingar a morte do colega morto", disse o
integrante da SSPDS. As execuções começaram por volta da meia-noite, mas
"a situação saiu de controle. Testemunhas das execuções também foram
mortas. Viaturas da área passaram a levar feridos para os hospitais da região,
assim como vizinhos e parentes conduziram alguns jovens baleados para as
unidades de saúde", afirmou a fonte ouvida pelo jornal.
O servidor da SSPDS disse que os militares
envolvidos sustentam, com o objetivo de justificar a chacina, que quase todas
as pessoas que foram mortas eram envolvidas com atividades criminosas, apesar
de não terem antecedentes criminais. A Secretaria da Segurança Pública e Defesa
Social (SSPDS) divulgou, um dia após as execuções, as fichas das vítimas.
Conforme a SSPDS, dos 11 mortos sete eram adolescentes, com idades de 16 e 17
anos. Os demais tinham idade entre 18 e 41 anos. Apenas três deles respondiam
por delitos leves, como acidente de trânsito, pensão alimentícia e ameaça.
Sem comentários
Apesar de o secretário da Segurança Pública,
Delci Teixeira, ter afirmado em entrevista coletiva na última quarta-feira (6)
que a investigação sobre a chacina estava concluída e seria remetida à Justiça,
a CGD, por meio da Delegacia de Assuntos Internos (DAI), ainda não se
pronunciou oficialmente sobre quantos policiais foram indiciados pelas mortes.
Representantes do Ministério Público que estão envolvidos nas investigações
também não responderam ao pedido da reportagem para comentar o fim das
investigações e informar sobre os indiciamentos.
Execuções
11 Pessoas morreram na maior chacina da
Capital. As vítimas tinham idades entre 16 e 41 anos. Apenas três tinham
antecedentes criminais por delitos leves
7 Feridos permaneceram por dias em hospitais,
sob escolta. Somente, alguns integrantes da Secretaria da Segurança Pública
(SSPDS) sabiam em que unidades eles estavam
Fonte: Diário do Nordeste
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