O número de surtos de caxumba no Brasil tem
aumentado de forma significativa nos últimos anos, batendo recordes anuais em
diversos municípios brasileiros, mesmo com a vacina para a doença disponível na
rede pública de saúde. Segundo o vice-presidente da Sociedade Brasileira de
Imunizações, Renato Kfouri, há no país uma geração de jovens adultos que não
recebeu as duas doses da vacina contra a caxumba e está mais propensa a ter a
doença.
“Há vários anos o Brasil acumula uma parte da
população não foi vacinada e isso propicia a circulação do vírus. Ainda não
passaram por campanhas nacionais de vacinação para adultos da tríplice viral e
nasceram antes de a vacina ser incorporada ao calendário nacional de vacinação
na primeira infância.”
Além da maior quantidade de casos, o perfil
dos contaminados também mudou. Nos últimos anos observou-se deslocamento da
faixa etária da caxumba – que era mais comum em crianças pequenas – para
crianças acima de dez anos, adolescentes e adultos jovens. Nesses casos, a
doença pode ser mais severa e levar à encefalite e meningite. Segundo o
especialista, é preciso ter atenção às possíveis complicações da doença, mas
não há motivo para alarde.
A vacina tríplice viral, que protege contra
sarampo, rubéola e caxumba, entrou para o calendário básico de vacinação, a
crianças de 1 ano de idade, em 1996. Uma segunda dose era aplicada em campanhas
posteriores. A segunda dose da vacina passou a integrar o calendário básico aos
4 anos a 6 anos de idade em 2006. Desde 2013, o Ministério da Saúde recomenda
uma dose da vacina tríplice viral ao atingir 1 ano de idade e uma dose da
vacina quádrupla viral ao chegar ao 1 ano e três meses de idade.
De acordo com nota técnica do Instituto de
Tecnologia em Imunobiológicos Bio-Manguinhos, a eficácia da vacina contra a
caxumba é a menor da tríplice viral. Enquanto no sarampo e na rubéola duas
doses dão 95% de proteção, a melhor estimativa da eficácia da vacina para
caxumba em crianças e adolescentes é de 64% a 66% para uma dose e de 83% a 88%
para duas doses.
O ministério da Saúde afirma que a vacina é o
melhor remédio. Renato Kfouri concorda e defende que é preciso levar em conta
que, mesmo entre os que estão com a vacinação em dia, existe essa porcentagem
que pode adoecer, que é a “falha vacinal”, mas afirma que a caxumba é “bem mais
controlada” entre a geração vacinada. A dica do médico é manter a vacinação em
dia, seja criança adolescente ou adulto.
“É importante ressaltar que a caxumba é uma
doença considerada benigna com uma taxa de complicações muito baixa e quase
nunca fatal”, informou em nota o ministério da Saúde. Na ausência de
imunização, 85% dos adultos poderão ter a doença, sendo que um terço dos
infectados não apresentará sintomas.
Surtos no país
O surto de caxumba na escola do filho de 14
anos, em Brasília, levou a doença para dentro da casa de Camila Rocha. Nove
adolescentes da turma do estudante adoeceram, entre eles, o Murilo, que tinha
as duas doses recomendadas da vacina. “Ele teve muita febre, ficou com o
pescoço bastante inchado e muita dor no corpo”, contou Camila, aliviada porque
o filho está melhor e já voltou às aulas após 14 dias em casa.
Quando Murilo adoeceu, Camila e o marido,
Luiz Roberto Pedrosa, se deram conta de que não eram vacinados contra a
caxumba, e ficaram esperando os sintomas, sem saber se também ficariam doente.
“Estamos sem contato com a nossa família para evitar transmitir a doença. Desde
o dia 31 de março eu não vejo a minha mãe e a minha avó. Desde que o Murilo
adoeceu, eu e meu marido ficamos ansiosos sem saber se íamos pegar e realmente
todos pegamos.”
Os sintomas de Camila apareceram no último
domingo. Ontem, Luiz Roberto Pedrosa também apresentou os primeiros sintomas.
Camila ficou com o pescoço inchado e teve muita dor no corpo, “como uma gripe”,
disse. “Mas a partir do terceiro dia já começa a melhorar”.
A família de Camila é uma das milhares que
estão adoecendo em surtos de caxumba cada vez mais frequentes. No ano passado,
a Secretaria de Saúde do Distrito Federal contabilizou os surtos a partir do
segundo semestre, e notificou 130 casos da doença de julho a dezembro. Este
ano, a Diretoria de Vigilância Epidemiológica registrou 11 surtos de caxumba em
residências, escolas e em complexos penitenciários. No total, 525 pessoas
tiveram a doença.
Em 2016, 142 detentos e funcionários de
presídios da capital federal apresentaram sintomas da doença no Centro de
Progressão Penitenciária (CPP), no Centro de Detenção Provisória (CDP) e no
Centro de Internação e Reeducação (CIR).
A Secretaria de Saúde informou que, apesar do
grande número de casos, não haverá campanha para vacinação e que a vacina está
disponível ao longo de todo o ano em todos os centros de saúde.
Não há números nacionais sobre os surtos de
caxumba. A notificação dos casos individuais da doença não é obrigatória no
Brasil e costuma ser feita apenas em situação de surtos em domicílios, escolas,
ambientes de trabalho, quando a vigilância epidemiológica local deve ser
informada. Mesmo assim, os números são considerados subestimados. Por meio de
nota, o Ministério da Saúde explicou que estados e municípios têm autonomia
para registrar os casos da doença e consolidar os dados sobre a caxumba.
Em Porto Alegre, foram notificados nove
surtos de caxumba nos primeiros quatro meses do ano, número três vezes maior
que o do mesmo período do ano anterior, de acordo com a Secretaria Municipal da
Saúde. Outras cidades gaúchas registraram aumento de casos da doença, como
Pelotas e Rio Grande. Desde março, também vem sendo registrado aumento de casos
em Florianópolis. Em Curitiba, foram confirmados 342 casos de caxumba nos
quatro primeiros meses de 2016.
Na cidade de São Paulo, o número de casos em
2016 já supera os registrados em 2015. A Secretaria Municipal de Saúde
registrou 346 casos até o dia 14 de maio. No mesmo período do ano passado,
foram registrados 68 casos. Campinas e Judiaí também registraram grande aumento
de surtos.
A notificação da doença é compulsória em
Minas Gerais desde 2001. Em 2015, o estado registrou 3.502 casos da doença. Até
o fim de abril desse ano, a Secretaria de Estado de Saúde de Minas registrou
435 casos de caxumba e dois surtos nas regiões Sudeste e Sul do estado.
A Região Nordeste também registrou casos da
doença, na Bahia, em Pernambuco e no Piauí. Em Olinda houve um surto de caxumba
em uma escola em abril e maio deste ano. No total, 12 pessoas ficaram doentes.
Em 2015, a Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco não havia registrado
nenhum caso da doença.
Vacinação
O Ministério da Saúde oferece duas vacinas
contra a doença no calendário nacional de vacinação, a tríplice viral e a tetra
viral, que inclui proteção contra varicela. A distribuição dessas vacinas aos
estados é realizada mensalmente.
De acordo com o ministério, em abril deste
ano foi autorizado para todo o país o envio de 101 mil doses da tetra viral e
de 1 milhão de doses da tríplice viral. Na rede pública de saúde, a vacina
tríplice viral, aplicada ao 1 ano de vida, e a vacina tetra viral, aplicada ao
1 ano e três meses de vida, protegem contra a doença.
Para crianças e adolescentes de até 19 anos
são ministradas duas doses. Para pessoas entre 20 e 49 anos recomenda-se apenas
uma dose da vacina tríplice viral.
A doença
A caxumba é uma doença viral aguda causada
pelo vírus Paramyxovirus. A transmissão ocorre por meio do contato com a saliva
de pessoas infectadas e a maior ocorrência da doença é no inverno e na
primavera, período de temperaturas mais baixas. A incubação da doença varia de
12 a 25 dias e o período de transmissão dura de 16 a 18 dias.
Em casos de notificação de surto da doença,
os pacientes devem ficar isolados e deve ser avaliada a caderneta de vacinação
de todos que tiveram contato com os pacientes.
A principal e mais comum manifestação desta
doença é o aumento das glândulas salivares, principalmente a parótida,
acompanhada de febre. Em menores de cinco anos de idade são comuns sintomas das
vias respiratórias e perda neurosensorial da audição. A caxumba também pode
ocasionar aborto espontâneo no primeiro trimestre da gestação.
Agência Brasil
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