A ideia inicial do governo do Estado era de que o Aquífero
Litorâneo, compreendido num campo de dunas e lagoas de 248 Km², já tivesse em
atuação a partir do mês passado. O atraso no projeto se somou aos seguidos
adiamentos de se contar com as águas da Transposição do Rio São Francisco, a
fim de atender a Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). Com isso, o déficit
hídrico aumenta na direção inversa das soluções para o problema.
O Aquífero Litorâneo tem sido uma das apostas do Estado, por
meio da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh), para ter uma oferta
de água na RMF, que até o fim do ano deverá ter reservas ainda mais diminutas.
O projeto consiste no aproveitamento de águas subterrâneas localizadas em
áreas, especialmente no Litoral Oeste, que vão do Pecém, em São Gonçalo do
Amarante, até o Paracuru.
Apesar do atraso, o presidente da Cogerh, João Lúcio Farias
de Oliveira, diz que a consecução do projeto é irreversível. Ele salienta que
há uma necessidade urgente de uso desse potencial hídrico para atender,
principalmente, às respectivas comunidades envolvidas do perímetro.
A Cogerh realizou um estudo em área do litoral cearense,
apontando o potencial para atender parte das demandas do lado oeste da RMF. Com
isso, haveria a possibilidade economia das reservas dos açudes que abastecem a
Capital e Região Metropolitana, que atingiram os índices mais baixos.
Vulnerabilidade
A medida está incluída entre as ações que o governo vem
planejando para evitar colapso no fornecimento de águas nas regiões mais
vulneráveis. João Lúcio Farias explicou que, num primeiro momento, a perfuração
de poços se situará numa das áreas onde há um sistema de dunas, que favorece a
existência de aquíferos, podendo atender, prioritariamente, ao consumo humano.
Ao todo, deverão ser perfurados 42 poços, com até 400 metros
de profundidade. João Lúcio disse que em junho não se ficou de braços cruzados.
Pelo menos quatro poços foram perfurados, exatamente para estudo de vazão.
Curiosamente, essa intenção, que vai atender cidades e
distritos de São Gonçalo até Paracuru, ainda é desconhecida por gestores
municipais. O prefeito de Paracuru, Sidney Gomes (PCdoB) disse que é conhecedor
dos estudos da Cogerh, mas não foi informado sobre os detalhes da consecução do
projeto.
Para ele, a iniciativa é louvável, até porque há comunidades
que, mesmo com as chuvas deste ano, se ressentem da falta d´água. Uma dessas é
a Quatro Bocas, onde os poços profundos já secaram. Os que ainda não chegaram a
esse ponto contam ainda com a desvantagem de a água ser salinizada.
Aflição
Numa ação emergencial, a Superintendência de Obras
Hidráulicas (Sohidra), mantida pela Secretaria de Recursos Hídricos (SRH),
iniciou, durante a semana que passou, a perfuração de um poço, com até 80
metros de profundidade, mas a obra foi interrompida porque o compressor
quebrou.
"A questão da falta d´água não é só por conta dos anos
seguidos de seca. Mas é porque nunca houve uma atenção com as
comunidades", disse o agricultor Francisco Erasmo Félix dos Santos. Ele
confessa não entender porque as populações sofrem todos os anos com o mesmo
problema. Na semana passada, ele buscava uma área próxima à Lagoa Santa Cecília
para iniciar um cultivo de feijão e mandioca.
Contudo, é nas tarefas domésticas que potes e outros
recipientes vazios mais afligem a população de Quatro Bocas. Segundo a moradora
Maria José Moraes, 22, até mesmo o chafariz secou. Agora, todas as esperanças
estão depositadas no poço prometido pela Sohidra.
O chefe de gabinete da Prefeitura de Paraucuru, Ângelo Tuzzi,
disse também desconhecer a iniciativa proposta pela Cogerh, mas entende como
viável. "Há tempos que somos informados de um grande volume de água sob as
dunas. Por que não é aproveitado?", indaga. Além disso, há um conjunto de
lagoas do Município que fazem um contraponto radical com as regiões secas do
Estado.
Além da Lagoa de Santa Cecília, que está em um terreno
particular, existe ainda a Lagoa Grande, que abastece a cidade. Durante algum
tempo, essa água era utilizada pela Petrobras para lavar cascos de navios
petroleiros.
Dessalinização
Uma outra saída prometida para a região de onde se instalou o
Complexo Portuário do Pecém é o projeto piloto da Usina de Dessalinização. O
presidente da Cogerh disse que a determinação é que essa ação tenha início já
no segundo semestre e, conforme o desempenho, poderá ser expandida.
João Lúcio explica que, nesse primeiro momento, não haverá
custos para o Estado, porque se trata de uma experiência no Ceará, por meio de
uma empresa espanhola. O terreno já foi cedido para a instalação da usina.
Desvantagem
Não obstante as saídas apresentadas pelo governo para reduzir
o déficit hídrico no Ceará, há quem veja um excesso de otimismo. Esse é o caso
do engenheiro Hypérides Macedo, ex-secretário de Recursos Hídricos do Estado.
Na sua opinião, a grande dificuldade do Projeto Aquífero Litorâneo é a
limitação de reservas d´água, inclusive para as próprias comunidades.
"Quem tem um poço em área próxima à praia sabe o quanto
é difícil extrair água do subsolo. Ele diz que é uma água de boa qualidade, mas
um luxo, que somente dar para atender a uma pequena demanda, como "águas
minerais servidas em restaurante", compara.
Com relação ao projeto de dessalinização, entende que o custo
é a maior desvantagem. Baseado no que percebeu na Espanha, numa viagem
realizada há quase 20 anos, o investimento é alto. Na ocasião, observou que o
produto era fornecido para uma área residencial, ocupada por milionários. Numa
outra comparação, lembra que o metro cúbico da água dessanilizada sai por cerca
de R$ 4. Enquanto isso, o metro cúbico da água do Açude do Castanhão tem um
valor de R$ 0,30.
"Essas propostas são de ação local. São águas de
salvação, mas não de soluções permanentes. Para Fortaleza e cidades vizinhas, a
saída é uma oferta em escala maior", afirmou Hypérides Macedo.
Fonte: Diário do Nordeste
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