Diálogos divulgados pelo Ministério
Público do Ceará (MPCE) revelam como sargentos da Polícia Militar agiram na
extorsão em sequestro de traficante. Por meio de interceptações telefônicas,
policiais da Coordenadoria de Inteligência (Coin) identificaram que sargentos
acusados mantinham estreita relação com um homem que seria envolvido com o
tráfico e atuava como “fiteiro”, repassando informações para que os militares
pudessem praticar os crimes.
Na manhã de ontem, quatro sargentos
lotados no 17º Batalhão da PM foram presos no Conjunto Ceará. O homem que
passava informações também teve a prisão decretada, mas está foragido. O crime
foi descoberto por promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime
Organizado (Gaeco), do MPCE, e pela Coin da Secretaria da Segurança Pública e
Defesa Social (SSPDS).
A investigação atuava na busca por
organizações criminosas no Estado.
Um inquérito, que corria em segredo de
Justiça, revelou que os policiais, “reiteradamente”, extorquiam traficantes e
outros delinquentes, que chegavam a ser mantidos reféns até que os pagamentos
ocorressem.
Na ação, foram presos os policiais:
Auricélio da Silva Araripe, Glaydson Eduardo Saraiva, Jeovani Moreira Araújo e
Rilmar Marques dos Santos.
Todos passaram por exames na Perícia
Forense do Ceará (Pefoce) e foram conduzidos por equipes da Controladoria Geral
de Disciplina (CGD) ao Comando Geral da PM, sendo, depois, encaminhados ao
Presídio Militar, na sede do 5º BPM, no Centro, onde permanecem até o
pronunciamento da Justiça.
O crime
Em uma das ligações, enquanto
traficante era mantido refém, o sargento Auricélio chega a pressionar Jeovani
Moreira quando ele fala da dificuldade de conseguir dinheiro de um dos
sequestrados. “Acocha, acocha, que já juntamos 30 contos (R$ 30 mil) numa
noite”. Nas conversas, é possível perceber que Auricélio era um dos principais
atuantes e mantinha relação estreita com o “fiteiro” que repassava informações.
“Fica tranquilo aí que eu vou marcar esse bote aí para nós (sic) aumentar esse
dinheiro aí”, afirma “fiteiro”; ao que Auricélio confirma: “É, vai dar para
aumentar legal”.
Conforme promotor Felipe Diogo, na
extorsão em questão, o grupo foi flagrado usando viatura do 17º BPM para
abordar, na avenida Osório de Paiva, um veículo Volkswagen Golf. O carro
pertencia a traficante, que portava quantidade não informada de cocaína. O
homem foi então sequestrado pelos policiais, que exigiram a quantia de R$ 7 mil
para libertá-lo, evitando a prisão.
“Esse mesmo traficante havia assaltado
um policial federal e roubado a pistola dele. Ele temia sofrer alguma violência
por conta disso”, detalhou. Segundo o promotor, o traficante, que passou à
condição de vítima dos PMs, foi colocado em um Toyota Corolla. Entre as 21
horas e 1 hora da madrugada seguinte, ele ficou em poder dos policiais,
circulando por diversos endereços, para obter a quantia exigida. Sem sucesso, o
homem entregou cerca de R$ 1 mil, além do som do carro, que valeria de R$ 8
mil. “O traficante só foi liberado mediante a promessa de entregar mais
dinheiro no dia seguinte”, aponta.
Os quatro policiais se tornaram réus
tendo a denúncia acatada pela juíza Lia Sammia Sousa Moreira, da Vara da
Auditoria Militar, que também determinou as prisões preventivas. A partir de
agora, o processo entrará na fase de instrução, quando os militares poderão
apresentar suas defesas.
Saiba mais
O promotor Felipe Diogo afirmou que um
dos sargentos foi flagrado com uma pequena quantidade de maconha, o que motivou
a inclusão do crime de tráfico de drogas, já que o policial declarou não ser
usuário.
Diogo não soube informar, porém, com
qual dos quatro estava a droga.
Uma quantia em dinheiro, parte dela em
moedas, também foi apreendida. Os militares não esclareceram a origem dos
recursos. Além do processo criminal, os policiais envolvidos nos crimes
responderão a procedimento disciplinar na CGD, que pode levar à demissão do
grupo. O POVO procurou o comandante-geral da PM, Ronaldo Viana.
Entretanto, o coronel afirmou que não
se manifestaria sobre as prisões, pois não estava “acompanhando o caso de
perto”. A reportagem também procurou associações de profissionais da segurança
que informaram que não estão acompanhando o caso.
O POVO - THIAGO PAIVA | EDUARDA TALICY
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