quarta-feira, 2 de agosto de 2017

GRAVAÇÕES REVELAM AÇÃO DE PMS EM EXTORSÃO DE TRAFICANTES

Diálogos divulgados pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) revelam como sargentos da Polícia Militar agiram na extorsão em sequestro de traficante. Por meio de interceptações telefônicas, policiais da Coordenadoria de Inteligência (Coin) identificaram que sargentos acusados mantinham estreita relação com um homem que seria envolvido com o tráfico e atuava como “fiteiro”, repassando informações para que os militares pudessem praticar os crimes.

Na manhã de ontem, quatro sargentos lotados no 17º Batalhão da PM foram presos no Conjunto Ceará. O homem que passava informações também teve a prisão decretada, mas está foragido. O crime foi descoberto por promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do MPCE, e pela Coin da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS).
A investigação atuava na busca por organizações criminosas no Estado.

Um inquérito, que corria em segredo de Justiça, revelou que os policiais, “reiteradamente”, extorquiam traficantes e outros delinquentes, que chegavam a ser mantidos reféns até que os pagamentos ocorressem.

Na ação, foram presos os policiais: Auricélio da Silva Araripe, Glaydson Eduardo Saraiva, Jeovani Moreira Araújo e Rilmar Marques dos Santos.

Todos passaram por exames na Perícia Forense do Ceará (Pefoce) e foram conduzidos por equipes da Controladoria Geral de Disciplina (CGD) ao Comando Geral da PM, sendo, depois, encaminhados ao Presídio Militar, na sede do 5º BPM, no Centro, onde permanecem até o pronunciamento da Justiça.

O crime

Em uma das ligações, enquanto traficante era mantido refém, o sargento Auricélio chega a pressionar Jeovani Moreira quando ele fala da dificuldade de conseguir dinheiro de um dos sequestrados. “Acocha, acocha, que já juntamos 30 contos (R$ 30 mil) numa noite”. Nas conversas, é possível perceber que Auricélio era um dos principais atuantes e mantinha relação estreita com o “fiteiro” que repassava informações. “Fica tranquilo aí que eu vou marcar esse bote aí para nós (sic) aumentar esse dinheiro aí”, afirma “fiteiro”; ao que Auricélio confirma: “É, vai dar para aumentar legal”.

Conforme promotor Felipe Diogo, na extorsão em questão, o grupo foi flagrado usando viatura do 17º BPM para abordar, na avenida Osório de Paiva, um veículo Volkswagen Golf. O carro pertencia a traficante, que portava quantidade não informada de cocaína. O homem foi então sequestrado pelos policiais, que exigiram a quantia de R$ 7 mil para libertá-lo, evitando a prisão.

“Esse mesmo traficante havia assaltado um policial federal e roubado a pistola dele. Ele temia sofrer alguma violência por conta disso”, detalhou. Segundo o promotor, o traficante, que passou à condição de vítima dos PMs, foi colocado em um Toyota Corolla. Entre as 21 horas e 1 hora da madrugada seguinte, ele ficou em poder dos policiais, circulando por diversos endereços, para obter a quantia exigida. Sem sucesso, o homem entregou cerca de R$ 1 mil, além do som do carro, que valeria de R$ 8 mil. “O traficante só foi liberado mediante a promessa de entregar mais dinheiro no dia seguinte”, aponta.

Os quatro policiais se tornaram réus tendo a denúncia acatada pela juíza Lia Sammia Sousa Moreira, da Vara da Auditoria Militar, que também determinou as prisões preventivas. A partir de agora, o processo entrará na fase de instrução, quando os militares poderão apresentar suas defesas.



Saiba mais

O promotor Felipe Diogo afirmou que um dos sargentos foi flagrado com uma pequena quantidade de maconha, o que motivou a inclusão do crime de tráfico de drogas, já que o policial declarou não ser usuário.

Diogo não soube informar, porém, com qual dos quatro estava a droga.

Uma quantia em dinheiro, parte dela em moedas, também foi apreendida. Os militares não esclareceram a origem dos recursos. Além do processo criminal, os policiais envolvidos nos crimes responderão a procedimento disciplinar na CGD, que pode levar à demissão do grupo. O POVO procurou o comandante-geral da PM, Ronaldo Viana.

Entretanto, o coronel afirmou que não se manifestaria sobre as prisões, pois não estava “acompanhando o caso de perto”. A reportagem também procurou associações de profissionais da segurança que informaram que não estão acompanhando o caso.


O POVO - THIAGO PAIVA | EDUARDA TALICY

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