O juiz Jayder Ramos de Araújo, da 10ª
Vara Cível de Brasília, condenou o presidenciável Ciro Gomes (PDT) ao pagamento
de R$ 30 mil ao presidente Michel Temer por danos morais. A decisão foi
decretada no último dia 28 de julho.
“Julgo procedente o pedido para
condenar o requerido a pagar ao autor, a título de danos morais, a importância
de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), corrigida monetariamente pelo INPC a partir
desta data e acrescida de juros legais de 1% ao mês a contar do evento danoso
(14/12/2015).
Ciro, em entrevista cedida no dia 14 de
dezembro de 2015, afirmou que Temer faz parte do “lado quadrilha do PMDB” e
chamou o peemedebista de “capitão do golpe”, fazendo referência ao impeachment
da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).
“Condeno o requerido ao pagamento das
custas processuais e dos honorários advocatícios que arbitro em 10% (dez por
cento) sobre o valor da condenação, na forma do artigo 85, caput e § 2º, do
NCPC”.
Ciro ainda tentou recorrer e trancar o
processo, mas seu pedido foi negado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª
Região. Com a sentença, é a segunda vez que Ciro e seu escritório de advogacia
são derrotados na Justiça pelo presidente.
Confira a decisão
“Sentença condenatória do Indivíduo
Ciro Gomes, mantida pelo TJDF:
Circunscrição : 1 – BRASILIA
Processo : 2016.01.1.007506-0
Vara : 210 – DECIMA VARA CIVEL DE
BRASILIA
Processo : 2016.01.1.007506-0
Classe : Procedimento Comum
Assunto : Indenização por Dano Moral
Requerente : MICHEL MIGUEL ELIAS TEMER
LULIA
Requerido : CIRO FERREIRA GOMES
SENTENÇA
Trata-se de ação de indenização por
danos morais proposta por MICHEL MIGUEL ELIAS TEMER LULIA em face de CIRO
FERREIRA GOMES.
Narra a parte autora, em síntese, que:
a) em 04/12/2015 o réu concedeu entrevista a um programa da Rede TV; b) dentre
os comentários, o réu fez pesadas críticas em face do autor atacando-lhe a
honra e a imagem por meio de palavras difamatórias e injuriosas, denominando-o
de “capitão do golpe” para derrubar a Presidente Dilma Rousseff; c) segundo
teria dito o réu, o autor seria beneficiário direto da ruptura política,
acusando-o deliberadamente de ser o responsável e conspirador de uma potencial
crise no país; d) posteriormente, o réu continuou o ataque pessoal em diversas
outras entrevistas, fato que repercutiu na internet, redes sociais e mídias; e)
em entrevista à Carta Capital, o réu afirma que o autor faz parte do “lado
quadrilha do PMDB”, acusando-o ainda de ser “comprometido medularmente com a
corrupção”; f) a honra e a imagem do autor restaram manchadas com as acusações
de cometimento de supostos crimes; g) as palavras utilizadas pelo réu, por si
sós, carregam conotação fortemente negativa à imagem do autor.
Requer o julgamento de procedência do
pedido para condenar o réu ao pagamento de indenização por danos morais, mais
custas processuais e honorários advocatícios.
A inicial está instruída com os
documentos de fls. 15/51 e 56.
O réu apresentou contestação às fls.
63/80. Alega que: a) o “impeachement” da Presidente da República foi fato
amplamente divulgado na imprensa nacional e internacional, sob a articulação
política do então Vice-Presidente, violando o dever de proteção à Constituição;
b) ao chamá-lo de “capitão do golpe” e “conspirador” reproduziu o pensamento de
parcela significativa da população que é contra o “impeachment”; c) opiniões
semelhantes foram emanadas por vários políticos; d) não restou caracterizado
dano moral; e) o homem público é exposto às mais diversas críticas, opiniões e
discordâncias, não passando as críticas narradas na inicial de mero aborrecimento;
f) ao falar sobre o “lado quadrilha do PMDB” o réu pretendia demonstrar o
descaso do autor para com colegas acusados de corrupção. Ao final, questiona a
destinação do valor pretendido e pugna pelo julgamento de improcedência dos
pedidos formulados.
Em réplica (fls. 84/91), a parte autora
defende que houve extrapolação dos limites do direito de expressão por parte do
réu e que a destinação de eventual valor condenatório não afeta o direito à
reparação pretendida. No mais, reitera os termos da inicial.
É o breve relatório.
DECIDO.
As questões controvertidas estão
suficientemente elucidadas pelos documentos juntados pelas partes, estando o
processo em condição de receber julgamento. Assim, julgo antecipadamente a
lide, a teor do disposto no artigo 355, inciso I, do NCPC.
Consoante o disposto no artigo 927 do
Código Civil, “aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a
outrem, fica obrigado a repará-lo”.
Por seu turno, o art. 186 do CC dispõe
que comete ato ilícito quem, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
moral.
Extrai-se, daí, que a responsabilidade
civil extracontratual exige a presença dos seguintes pressupostos: conduta
ilícita dolosa ou culposa, nexo de causalidade e dano.
Conforme o disposto no art. 5º, incisos
IV e XIV, da CF, é livre a manifestação do pensamento, bem como é assegurado a
todos o acesso à informação.
Contudo, esses direitos não são
absolutos, pois convivem com outros direitos e garantias constitucionais não
menos relevantes, como o direito à intimidade, à vida privada, à honra, e à
imagem, nos termos do art. 5º, inc. X, da CF.
Na colisão aparente entre direitos
dessa envergadura, deve ser realizado um juízo de ponderação, levando-se em
consideração o tipo de manifestação emanada, a natureza crítica, caluniosa,
injuriosa ou difamatória da divulgação, bem como as pessoas envolvidas e o
contexto em que as palavras foram proferidas.
As pessoas públicas, mais
especificamente o agente público ocupante de cargo eletivo, cujo poder emana do
povo, está, naturalmente, mais suscetível às manifestações contrárias,
reclamações, denúncias ou críticas, porquanto a sua forma de agir e de se
portar sempre serão objeto de avaliação contínua por aqueles que lhe confiaram,
no processo democrático das urnas, o mandato eletivo.
O momento político do Brasil inflou
discussões acaloradas e apaixonadas entre grupos pró-impedimento e
contra-impedimento da Presidente da República. Desde dezembro de 2015, com o
início do processo de impeachment na Câmara dos Deputados, os defensores do
governo defendiam, ardorosamente, que a Presidente da Repúblic
a não teria praticado os crimes de
responsabilidade a ela imputados e qualificavam o procedimento de afastamento
como golpe.
Essa tese foi dita e repetida durante
todo o procedimento que redundou no julgamento de impedimento e, mesmo após a
conclusão do processo, ainda continua a ser sustentada pelos defensores do
Governo Dilma.
A discussão sobre o golpe ganhou
repercussão na mídias nacionais e internacionais, de forma que não havia um
brasileiro que estivesse alheio à questão, conhecendo os argumentos favoráveis ou
contra o impeachment, em especial a tese de golpe sustentada pelos defensores
do Governo.
Durante o debate político sobre a
questão, o réu externou a sua posição nos meios de comunicação, em que fez
duras críticas ao requerente e declarou, dentre outras, que Michel Temer seria
o articulador e o capitão do golpe que pretendia derrubar a Presidente Dilma;
que o autor pretendia tirar vantagem indevida em proveito próprio e em desfavor
do país e que ele era o responsável e conspirador por uma potencial crise no
país.
Essas manifestações do réu, embora
duras e ácidas, estavam contextualizadas com o tema central do debate nacional
e coincidiam com a opinião de uma parcela da população. Nesse sentido, não há
como censurá-las, pois decorriam da liberdade conferida a todos os cidadãos em
um Estado Democrático de Direito e não tinham o propósito de atingir,
especificamente, a honra do autor.
No entanto, na entrevista acostada às
fls. 47/50, intitulada “Temer é o homem do Cunha, e não o inverso”, o requerido
afirmou que o autor estaria “comprometido medularmente com a corrupção” (fl.
49) e, em outra passagem, disse: “Pior: colocou um golpista dentro do Palácio.
Isso é muita irresponsabilidade. O governo selou aliança com o lado quadrilha
do PMDB” (fl. 50), deixando claro e evidente pelo contexto que estava se
referindo ao requerente, pois era ele quem ocupava, à época, o cargo de
Vice-Presidente da República.
Essas duas manifestações revelaram o
propósito do réu de depreciar e difamar a imagem e o bom nome do requerente,
uma vez que imputavam a ele a pecha de um político comprometido com a corrupção
e que integrava uma espécie de quadrilha formada dentro do seu partido
político.
O requerido é um homem conhecido na
política nacional e suas manifestações influenciam a formação da opinião da
população. Logo, embora pudesse insurgir-se contra o processo de impeachment,
deveria ter sido zeloso com as palavras proferidas, para que sua opinião não
transbordasse para o campo das ofensas pessoais e violasse a honra do autor.
Como assim não agiu, deve responder pela sua conduta ilícita, notadamente
porque ela ensejou danos extrapatrimoniais ao requerente.
Nesse mesmo sentido, trago o seguinte
precedente:
DIREITO CIVIL. UTILIZAÇÃO DE EXPRESSÃO
DEPRECIATIVA EM EVENTO PARTIDÁRIO. AUTORIA NÃO CONTESTADA EXPRESSAMENTE –
DIREITO À LIVRE EXPRESSÃO DO PENSAMENTO E À CRÍTICA. EXCESSO. OFENSA À HONRA.
DANO MORAL CONFIGURADO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. 1 – Ainda que se objete com
ausência de prova da autoria, na contestação o Requerido não a refuta
expressamente, ficando em meras conjecturas quanto a inexatidão da publicação.
2 – Embora seja livre a manifestação do pensamento, tal direito não é absoluto.
O manto do direito de manifestação não tolera abuso no uso de expressões que
ofendam a dignidade do indivíduo, de forma que o exercício irregular desse
direito comporta reprimenda estatal. 3 – A crítica entre políticos que desvia
para ofensas pessoais, atribuindo conduta socialmente desabonadora, causa dano
moral (REsp nº 801.249-SC). 4 – Causa lesão a direito de personalidade a
crítica voltada a agremiação partidária, personalizada nominalmente na pessoa
de seu presidente, com a utilização de expressões que o imputem o poder de
mando na prática de atos ilícitos. 5- Apelação conhecida e provida. Unânime.
(Acórdão n.954885, 20150111243315APC, Relator: ROMEU GONZAGA NEIVA 4ª TURMA
CÍVEL, Data de Julgamento: 13/07/2016, Publicado no DJE: 27/07/2016. Pág.:
271/279)
Nada obstante a dificuldade de traduzir
o abalo à honra em um quantitativo pecuniário, a Constituição Federal assegura,
em seu art. 5º, inciso X, o direito à indenização pelo dano de natureza moral.
O Código Civil, em seu artigo 944,
estabelece que a indenização mede-se pela extensão do dano, sem qualquer
limitação legal, a fim de prestigiar a sua reparação integral. Contudo, para
evitar o subjetivismo exacerbado no momento do arbitramento, a doutrina e a
jurisprudência cuidaram de traçar os critérios a nortearem o magistrado na
fixação de quantia indenizatória justa e proporcional.
No aspecto subjetivo, deve-se tomar em
consideração a situação econômica da parte ré, de modo a que a reparação
estabelecida não seja inócua diante da capacidade patrimonial dos envolvidos,
nem ainda excessivamente elevada, a ponto de significar a ruína do indenizador
ou o enriquecimento indevido do indenizado.
Sob o ângulo objetivo, prepondera a
natureza,
a repercussão e a gravidade do dano,
bem como o grau de culpa do seu causador.
Diante dos parâmetros acima alinhados,
em especial a repercussão e a atuação política dos envolvidos, entendo que a
indenização no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) bem atende às
particularidades do caso, mostrando-se um valor razoável e ponderado.
O arbitramento é realizado com a
estimativa do dano no momento do julgamento. Logo, a sua correção monetária
deverá ser considerada a partir da data da sentença. Os juros de mora, por seu
turno, devem ser computados a contar do evento danoso, na medida em que se
trata de ilícito extracontratual (Súmula 54 do STJ).
ANTE O EXPOSTO, julgo procedente o
pedido para condenar o requerido a pagar ao autor, a título de danos morais, a
importância de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), corrigida monetariamente pelo
INPC a partir desta data e acrescida de juros legais de 1% ao mês a contar do
evento danoso (14/12/2015).
Declaro resolvido o mérito, nos termos
do artigo 487, inciso I, do CPC.
Condeno o requerido ao pagamento das
custas processuais e dos honorários advocatícios que arbitro em 10% (dez por
cento) sobre o valor da condenação, na forma do artigo 85, caput e § 2º, do
NCPC.
Transitada em julgado, intime-se a
parte autora para que, caso tenha interesse, requeira o cumprimento de
sentença, sob pena de arquivamento.
Sentença registrada eletronicamente.
Publique-se. Intimem-se
Brasília – DF, segunda-feira,
26/09/2016 às 14h12.
Jayder Ramos de Araújo
Juiz de Direito
Circunscrição :1 – BRASILIA
Processo :2016.01.1.007506-0
Vara : 210 – DECIMA VARA CIVEL DE
BRASILIA
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO
Cuida-se de embargos de declaração
opostos pelo réu às fls. 100/115, em que alega omissão na sentença quanto à
análise dos argumentos relacionados às expressões apontadas pelo autor como
ofensivas, à destinação do proveito econômico e do pedido de produção de prova.
Ao final pugna pelo acolhimento dos embargos.
É o breve relatório. Decido.
Dispõe o art. 1.022 do NCPC que cabem
embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para esclarecer
obscuridade ou eliminar contradição, suprir omissão de ponto ou questão sobre o
qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento e corrigir erro
material.
No caso em apreço, a sentença não
padece das omissões alegadas. Desnecessária a reanálise dos argumentos
relacionados às expressões apontadas pelo autor como ofensivas, uma vez que a
sentença foi clara ao expor os fundamentos pelo qual julgou procedente o pedido
do autor.
A destinação do proveito econômico
obtido com a presente ação é irrelevante para o deslinde da causa e não tem o
condão de alterar o resultado do julgamento.
No tocante às provas, constou
expressamente do mandado de citação a determinação de especificação de produção
de provas (fl. 61) e, mesmo assim, o réu protestou genericamente pela produção
de todos os meios de prova (fl. 79).
Assim, considerando que o processo foi
instruído com a mídia da entrevista dada à televisão e as matérias divulgadas
na internet, tem-se por manifestamente desnecessária a produção de prova oral.
Em suma, mostra-se patente a intenção
de se emprestar efeito modificativo à decisão por meio de embargos de
declaração, inclusive com a reapreciação de questões enfrentadas no bojo da
sentença. Caso a parte pretenda a modificação da sentença, deverá interpor o
recurso adequado.
Ante o exposto, REJEITO os embargos de
declaração e mantenho íntegra a sentença prolatada.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília – DF, sexta-feira, 28/10/2016
às 10h43.
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