Estudantes do curso de Arquitetura e Urbanismo da Faculdade
Estácio FIC, com sede no Centro de Fortaleza, se depararam com uma imagem
artística, encoberta por camadas de tinta e revestimento de reboco, resultado
de reforma realizada no prédio centenário tombado, onde funcionou por 90 anos o
Colégio Marista Cearense. O achado ocorreu durante um minicurso de restauração
patrimonial na escola tombada como patrimônio cearense.
A descoberta revelou o que seria a imagem, em baixo relevo,
de Padre Anchieta, ambientada em uma paisagem litorânea. Quem afirma é Walden
Luiz, professor e coordenador do Departamento de Artes da instituição na década
de 1980, época em que a arte foi feita./
A memória de Walden é, até agora, o único arquivo da
idealização da imagem. De acordo com ele, a arte se trata de um painel com
extensão por toda a parede, em que o padre segura um cajado e escreve poemas à
Virgem Maria, na areia. "É um painel muito bonito. De início pintaram de
dourado, mas ficou muito chamativo e depois fizeram um envelhecimento. Fiquei
surpreso de terem tratado o painel com argamassa, foi feito numa talha de
cimento, era bem interessante", relembra o professor aposentado.
Ele diz que a arte ainda está clara na memória porque o
painel ficava na entrada do colégio, por onde passava diariamente.
´Enterrando a história´
Para Carolina Alves, professora do curso de restauração em
que a arte foi revelada – juntamente com o professor do curso de Arquitetura,
Frederico Barros – o achado reflete a falta de educação patrimonial na cidade,
já que a peça é parte histórica do prédio.
"O minicurso, de dois dias, era pra apresentar processos
que norteiam a restauração em edificações como essa, com valor de prédio
tombado. A proposta das aulas era intervir numa área que sabiam que tinha
passado por uma reforma sem critérios. Quem cobriu a arte com reboco pode ter
feito porque a arte já não estava íntegra. Mas isso mostra que a cidade vem
priorizando a estética e enterrando a história."
Segundo Carolina, a faculdade de arquitetura foi um dos
primeiros cursos a ocupar o prédio do antigo colégio, que tem valor histórico e
arquitetônico, tombado pelo município e pelo estado. "Além de ter ocupado
o local, uma das propostas era educar no sentido patrimonial, tanto para os
alunos, quanto na promoção de eventos e visitações pra sociedade". Com
essa ideia, organizou-se a Semana de Arquitetura, que trouxe o minicurso de
restauração como experiência além das disciplinas da grade curricular.
"Esse local onde começamos a trabalhar já estava
desprendendo da parede. Achamos que íamos encontrar uma sequência de cores que
mostrariam as pinturas que já tinham ocorrido lá ao longo dos anos. Iniciamos a
prospecção com bisturi, e encontramos esse baixo relevo artístico", conta
a professora. Ela diz que a turma buscou documentos e fotos antigas do prédio
para identificar a arte, mas nada foi encontrado.
A atividade, a princípio, com propósito mais particular de
demonstrar a restauração, passou a ser a de revelar um material histórico
esquecido do prédio. "Esse trabalho pode suprir uma lacuna
documental", destaca Carolina.
Pesquisa
Coordenadora do curso de Arquitetura e Urbanismo, Clélia
Monasterio reforça que ter encontrado a obra "foi uma bênção" para
dar oportunidade aos estudantes de trabalhar a investigação e preservação do
patrimônio. "É muito importante porque desenvolve esse sentimento e
vontade de trabalhar com a cultura, o patrimônio e a arte. Encontramos um
tesouro perdido, agora vamos continuar a busca", declara.
A ideia é transformar o trabalho em um grupo de pesquisa e
extensão, capacitar estudantes para seguirem com a investigação da obra e,
posteriormente, de outros pontos do prédio. Por ser patrimônio tombado, é
necessário antes regularizar a situação no município e estado.
Segundo a coordenadora, o local de investigação do painel tem
aproximadamente 9m². "Para acontecer, tem que ter cooperação entre a
instituição e a Estácio. É um trabalho de conversação, se trata de uma obra de
arte, precisa de pessoas especializadas."
G1
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