Itapajé. O medo e tensão ficaram estampados nos rostos de boa
parte dos moradores deste Município, distante 130Km de Fortaleza, por conta de
uma briga entre facções que causou a morte de dez internos da Cadeia Pública da
cidade. A unidade prisional foi palco de uma chacina, pouco mais de 48 horas
depois da maior matança já registrada no Estado quando, pelo menos, 14 pessoas
foram executadas, no 'Forró do Gago', no bairro Cajazeiras, em Fortaleza.
Ontem, dez mortes foram confirmadas dentro da unidade prisional.
Apenas um agente penitenciário atuava no momento dos assassinatos. Segundo a
Polícia Civil, o espaço contava com 84 presos. Membros do Comando Vermelho (CV)
e do Primeiro Comando da Capital (PCC) iniciaram o confronto, mas a Polícia não
revelou de qual facção pertenciam os detentos Diário do Noros que foram mortos.
Por volta de 8h30, moradores escutaram vozes com pedidos de
socorro e, em seguida, mais de 15 disparos foram ouvidos de dentro da Cadeia
Pública. Os gritos eram de "não atire, por favor". Uma moradora
(identidade preservada) contou que era possível escutar os detentos rindo e
recarregando as armas. "Escutamos pessoas chorando, desesperadas",
As ruas que são movimentadas toda manhã ficaram desertas. Comércios e residências não
abriram as portas. Às 9 horas, os primeirosveículos da Delegacia da Polícia
Civil de Itapajé chegaram no prédio público.
Horas depois, mais de 20 veículos das polícias Civil e
Militar e civil cercavam a cidade. Conforme o titular da Delegacia de Polícia
Civil de Itapajé, delegado André Firmino, os membros de facções eram separados
em celas, sendo duas para o Comando Vermelho (CV) e duas para o Primeiro
Comando da Capital (PCC). Porém, durante o banho de sol na manhã de ontem, que
costuma iniciar às 8h, os detentos entraram em conflito.
"É o momento mais delicado, porque ficam todos juntos no
pátio e é difícil segurar", comenta Firmino.
O delegado afirmou ainda que a ação da Polícia para tentar
conter a matança foi crucial para que o número de mortos não fosse maior. No fim
da tarde de ontem, 44 detentos foram transferidos para unidades penitenciárias
da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). Firmino ressaltou que os internos
foram transferidos no intuito de evitar um "novo banho de sangue".
Os presos mortos foram identificados como Alex Alan de Sousa Silva; Caio
Mendes Mesquita; William Aguiar da Silva; Francisco Davi de Sousa Mesquita;
Francisco Emanuel de Sousa Araújo; Francisco Helder Mendes Miranda; Francisco
Mateus da Costa Mendes; Manuel da Silva Viana; Carlos Bruno Lopes Silva; e
Francisco Elenilson de Sousa Braga.
Alguns internos ficaram feridos, tiveram atendimento no
hospital local e voltaram à unidade. Outros três presos tiveram ferimentos mais
graves e precisaram ser transferidos para Fortaleza. O confronto foi controlado
por agentes penitenciários e policiais do Município.
Do lado de fora, pais, filhos e esposas lotaram as ruas
vizinhas a Cadeia Pública. "Eu estava em casa quando eu descobri, no
WhatsApp, essa guerra dentro da Cadeia. Não consegui falar com ninguém da
Secretaria da Justiça e Cidadania (Sejus) para saber do meu marido", disse
uma mulher com uma criança de colo.
Durante a transferência dos internos, a Polícia dobrou o
número de equipes no entorno do ônibus do Sistema Penitenciário que levou os presos
para unidades prisionais da Região Metropolitana de Fortaleza. Das janelas
gradeadas, detentos acenavam e até faziam as iniciais das facções com as mãos
aos familiares que acompanhavam tudo da rua defronte à Cadeia. Alguns policiais
chegaram a utilizar gás de pimenta dentro do veículo para conter os ânimos de
alguns dos detentos.
Uma vistoria foi realizada na unidade prisional e os agentes encontraram
dois revólveres calibre 38, munições, duas facas, drogas e aparelhos celulares.
As armas foram levadas para realização de exames periciais na sede da Perícia
Forense do Estado do Ceará (Pefoce).
"Cenas de guerra quando a gente chegou. O sangue estava
sendo lavado no chão", declarou o supervisor do Núcleo de Assistência aos Presos
Provisórios e às Vítimas de Violência (Nuapp) da Defensoria Pública Geral do
Estado, defensor público Emerson Castelo Branco. Ele avaliou a situação da
Cadeia Pública de Itapajé como precária e de domínio das facções.
"É humanamente impossível uma cadeia com mais de 80
presos ter só um agente. É muito triste. Conversamos com a juíza da cidade. Ela
me disse que essa cadeia já havia sido anteriormente interditada". Segundo
o defensor, a maioria dos internos vivos e mortos são presos provisórios.
"Será pedido uma avaliação geral das cadeias públicas do Estado e
solicitada ao Ministério Público do Estado e a cada comarca uma avaliação das
unidades prisionais. Iremos ingressar com uma ação para interditar as cadeias
públicas que não tenham condição de funcionar. Quando falamos de funcionar, não
apenas a questão física, mas a questão humana", informou Emerson Castelo
Branco.
A supervisora do Núcleo de Execução Penal (Nudep) da
Defensoria Pública Geral do Estado, Marilene Venâncio, afirmou que foi muito
duro avisar para todas as famílias que estavam do lado de fora se os familiares
estavam vivos ou mortos. "A gente veio acompanhar a situação dos
sobreviventes e os familiares dos que vieram a óbito. Com relação aos presos
condenados, nós vamos acompanhar o Nuapp. Vamos também acompanhar os processos
de cada interno, ainda que continuem na comarca. Infelizmente, em Itapajé, nós
não temos defensor público titular, mas por esse caso, apesar das
transferências, vamos vir dois dias para acompanhar. Conversamos com a juíza
local para agilizar a documentação deles e na quinta-feira (1º) vamos ter as
informações processuais de todos os internos.
Investigações
Ainda na manhã de ontem, seis detentos foram ouvidos na
Delegacia do Município. Segundo eles, a chacina ocorrida na Cadeia Pública de Itapajé
não teve relação com as mortes que aconteceram em Fortaleza e Região
Metropolitana. "Eles disseram que não têm ligação, inclusive disseram que
não havia nenhum 'salve' dos líderes deles, não havia determinação neste
sentido", disse o delegado da Polícia Civil André Firmino.
A Polícia Civil indiciou seis internos acusados da chacina
por homicídio qualicado. Os detentos apontados como autores dos crimes foram identificados
como Alex Pinto Oliveira Rodrigues,24, que já responde por contravenção penal,
roubo, dano, direção perigosa, crimes de trânsito e porte ilegal de arma de
fogo; Antônio Jonatan de Sousa Rodrigues, com passagem por roubo e corrupção de
menores; Artur Vaz
Ferreira, com antecedentes criminais de furto e porte ilegal
de arma de fogo; Francisco das Chagas de Sousa, preso por lesão corporal dolosa,
porte e posse ilegal de arma de fogo; Francisco Idson Lima de Sales, acusado de
tentativa de homicídio e roubo; e William Alves do Nascimento (20), que já
responder por crime de trânsito e homicídio doloso.
Fonte: Diário do Nordeste
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