"Quando o açude está cheio
não fica barco emborcado, ninguém fica parado, sem trabalho. O açude Orós já
foi uma riqueza, com caminhões subindo cheio de peixes, mas agora é só
sequidão, quase não tem mais pesca. Só Deus para nos salvar". A observação
é da pescadora, Lucélia Alves de Lima, de 40 anos e que desde os sete começou a
pescar nas águas do segundo maior reservatório do Ceará. Assim como no
Castanhão, o cenário do Açude Orós é desolador. O reservatório acumula apenas
5,5% de sua capacidade total, que é de 2.109 milhões m³. A água se distanciou
das fazendas, inviabilizando ou reduzindo as atividades agropecuárias locais.
Para se ter uma ideia do impacto
da seca, há sete anos, o açude estava com sua capacidade máxima, a exemplo do
que ocorreu nos anos de 2008, 2009, por exemplo. Hoje, o baixo volume do
reservatório afeta a produção de pescado, leite, grãos e capim em unidades
produtoras nos municípios de Iguatu, Quixelô e no próprio Orós, todos na região
Centro-Sul do Ceará.
Prejuízos acumulados
Casada com Francisco Gregório da
Silva, que se viu obrigado deixar temporariamente a atividade de pesca, para o
plantio de uma vazante de feijão, Lucélia de Lima, conta que resiste em ser
pescadora. "Não gosto de roça", pontua. Diariamente Lucélia sai de
casa com o anzol nas mãos e um sonho no coração. "A gente espera que vai
chover, que a vida vai melhorar", confidencia a pescadora.
No entanto, quem insiste, como
ela, em colocar linhas com anzol e lançar redes na pouca água que ainda resta,
reclama da baixa quantidade de peixe. "Quase não está dando mais
nada", disse José Pedro Lima. "Com dificuldade a gente consegue
alguma tilápia e tucunaré, mas é tudo peixe pequeno", acrescenta.
O produtor de tilápia em tanques
redes e comprador de pescado de outros produtores, na bacia do Açude Orós,
Francisco Kinderman Oliveira de Lima, disse que a produção local caiu 90%.
"Se não chover neste ano, a
situação vai piorar, a produção vai parar e nesse quadro de dificuldades
ninguém tem coragem de investir".
Em maio de 2018, Kinderman Lima e
o pai, Antônio Neto, perderam mais de 100 toneladas de peixe, que morreram nas
gaiolas. O prejuízo foi estimado em quase um milhão de reais. Insistiram na
produção, mas diminuíram a quantidade de gaiolas. "A gente produzia 30
toneladas por mês, mas agora caiu para três toneladas", comparou. "A
gente tinha 600 gaiolas, mas agora só tem 300 e com reduzida quantidade de
pescado".
Arroz Irrigado
Nos últimos três anos, houve
significativa redução da área de cultivo por causa do baixo nível de água no
reservatório. Os produtores estimam queda de 20% na safra de 2018 em relação a
de 2017. Já em consideração a igual período de 2014, quando o açude acumulava
50%, a retração é de 90%.
"Já fomos uma das áreas de
maior produção de arroz irrigado no Ceará, nas várzeas do Orós e do Rio
Jaguaribe, mas a atividade enfrenta séria crise", pontuou o presidente do
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Iguatu, Evanilson Saraiva. O plantio de
arroz irrigado nas várzeas do Açude Orós ocorre no segundo semestre (a partir
de julho) e a colheita é feita sempre nos meses de novembro e dezembro.
Efeito
A perda de água no Orós criou um
clima de preocupação e de tristeza entre os moradores, produtores rurais,
piscicultores e aqueles que trabalham com o setor de serviço, alcançado com a
ausência dos turistas. A crise afeta os negócios na cidade, com queda nas
vendas nos postos de gasolina, lanchonetes e bares, farmácias e até
mercadinhos. "Sem renda, as pessoas compram menos, procuram priorizar o
essencial", disse o empresário, Luís Souza.
Nas proximidades da parede do
reservatório, já se observa áreas de terras, que antes estavam submersas e
agora formam ilhotas.
"O cenário aqui está
triste", disse a turista Leda Xavier, que mora em Juazeiro do Norte. O
vai-e-vem de moradores e visitantes no açude diminuiu. Os barcos estão
ancorados à espera de gente para passear. Os restaurantes estão completamente
vazios.
O açude Orós é responsável pelo
abastecimento das cidades de Orós, Jaguaribe, Jaguaretama, além de distritos de
Feiticeiro, Nova Floresta e dezenas de localidades rurais.
Os produtores rurais de Orós
reclamam por medidas compensatórias, porquanto alegam que não estão produzindo,
além da falta de água que vão enfrentar nas comunidades ribeirinhas. "Quem
antes plantava em vazantes agora está parado; quem criava peixe também cruzou
os braços", disse a moradora Francisca Oliveira.
Fonte: Diário do Nordeste Honório
Barbosa
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