Restando exatamente uma semana para o fim da quadra chuvosa, que se iniciou em fevereiro, o Ceará alcançou um número expressivo. As chuvas registradas ao longo deste período garantiram ao ano de 2019 a terceira melhor média pluviométrica das últimas duas décadas. Apesar disso, há pontos de preocupação. Devido à irregularidade espacial das chuvas, os principais reservatórios cearenses não conquistaram aporte hídrico suficiente. Será preciso, para o segundo semestre, usar a água de forma racional. Caso contrário, o Estado pode enfrentar, novamente, problemas no abastecimento, conforme autoridades da área de gestão hídrica.
Redução e prejuízos
A tendência para os últimos dias da quadra chuvosa é de diminuição de ocorrência de precipitações no Ceará. "O balanço parcial aponta que as chuvas ficarão dentro do previsto nos dois prognósticos, com melhor distribuição no Centro-Norte do Estado em detrimento da região Centro-Sul", mostrou o meteorologista da Funceme, Raul Fritz.
No Cariri, as chuvas ocorridas em 2018 superaram as deste ano. A consequência direta é a perda elevada de safra em municípios do Sul do Estado, uma das áreas importantes de produção de grãos. "O maior índice de frustração da safra ocorre no Cariri", disse o presidente da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Ceará (Ematerce), Antônio Amorim. "Em Jardim e Brejo Santo chega a 90% de perda".
As regiões Centro-Sul, parte do Sertão Central e Inhamuns registram, em um balanço parcial, perda de safra agrícola de sequeiro (aquela que depende exclusivamente da chuva). A irregularidade nas precipitações e o veranico ocorrido na segunda quinzena de abril e início de maio prejudicaram o desenvolvimento do plantio. O gerente regional da Ematerce, Virgolino Ferreira, disse que aguarda até o fim deste mês o relatório da situação de produção, mas observou perdas em Acopiara, Catarina, Jucás e Saboeiro. "Tivemos chuvas muito irregulares e localizadas", afirmou.
O Sul e Centro-Sul do Ceará são as mais afetadas com a perda da lavoura de grãos. Os dados parciais da Ematerce apontam, nessas duas regiões, frustração de safra que varia entre 60% e 80%. Na média estadual, o presidente do órgão estima perda de 20%.
A frustração de safra nas duas regiões com mais peso produtivo (Cariri e Centro-Sul) afeta a economia regional, gerando queda de receita e descapitalização do pequeno produtor rural. "O setor agrícola em crise impacta nas economias das cidades e é um quadro recorrente há alguns anos", pontuou Amorim.
O agricultor Clóvis Moreira, da comunidade Riacho Vermelho, zona rural de Iguatu, lamentou a segunda perda seguida do plantio de milho e feijão. "Talvez aproveite uns 20%", disse. "No tempo que precisava, as chuvas não vieram".
Irregulares
Para explicar essa dualidade de cenário, em que as chuvas se apresentaram com vigor, mas não foram suficientes para recarga hídrica ou tampouco para beneficiar a produção de grãos, Fritz recorre aos fenômenos naturais que incidem sobre o Estado. A justificativa está na atuação do fenômeno El Niño que contribuiu para que as precipitações no Sul e Centro-Sul do Estado fossem reduzidas.
"Não tivemos grandes aglomerados conectivos de nuvens de chuva, por isso houve muita irregularidade espacial e temporal", acrescentou o especialista da Funceme.
Açudes atingidos
A concentração da pluviometria nas regiões Norte e Litorânea afetaram a recarga de água nos principais reservatórios cearenses, que estão situados em outras regiões do Estado.
O Castanhão, maior açude do Ceará, acumulava no início da quadra chuvosa, 3,7% de sua capacidade máxima. Hoje, está com 5,5%. A recarga hídrica de apenas 1,8 ponto percentual é ínfima tendo visto o grande contingente de pessoas abastecidas por ele. O Castanhão é responsável pela segurança hídrica de mais de quatro milhões de pessoas do médio e baixo Jaguaribe e da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF).
O cenário no segundo maior reservatório cearense é o mesmo. Em fevereiro, o Orós acumulava 5,4% e, atualmente, está com 9,2%. O açude Banabuiú, terceiro em capacidade de água armazenada, passou de 5,4% para 8,1%.
Conforme o presidente da Cogerh, João Lúcio Farias de Oliveira, para que um reservatório consiga ultrapassar todo o segundo semestre do ano, período marcado pela ausência quase completa de chuvas, se faz necessária uma recarga de segurança de, em média, 20%. Este índice, no entanto, está distante na maioria dos reservatórios do Estado.
Dos 155 açudes monitorados pelo órgão, 72 estão com volume abaixo de 30%, 18 estão no volume morto e seis estão secos. Em contrapartida, 33 estão sangrando. Mesmo diante de tantos fatores que mantêm o alerta ligado no Estado, o gerente da Ematerce de Iguatu e Quixelô, Erivaldo Barbosa, ressalta que o cenário poderia ser pior.
"Se tivéssemos mais um ano com chuvas abaixo da média o cenário seria devastador. Temos que lembrar que o Estado enfrenta, nos últimos anos, sucessivos períodos de seca. Portanto, quando há números expressivos como estes, temos que comemorar, embora seja preciso atenção para o segundo semestre do ano que é marcado por poucas chuvas".
Fonte: Diario do Nordeste
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