Familiares da empresária Jamile de Oliveira Correia, morta depois de ser atingida por um tiro no próprio apartamento, em Fortaleza, alegam que estão recebendo ameaças nos últimos dias, desde que o caso passou a ser noticiado.
A morte foi tratada, a princípio, como suicídio, mas a polícia passou a cogitar a hipótese de feminicídio, cujo suspeito é o namorado de Jamile, o advogado Aldemir Pessoa Júnior. O caso teve início no dia 29 de agosto, em um condomínio de luxo, no Bairro Meireles, em Fortaleza. Imagens gravadas por câmeras de segurança mostraram o advogado agredindo a empresária dentro de um carro e, depois, carregando a mulher já baleada até o elevador do prédio.
Na noite desta quarta-feira (18), uma missa foi celebrada em memória de Jamile, no dia em que ela completaria 47 anos. Na ocasião, pessoas próximas à vítima contaram ao G1 que recebem mensagens de um homem ordenando que eles não falem sobre o assunto.
"São ligações estranhas. Eles dizem: ‘A família da Jamile vai pagar por isso’. A gente está abrindo o ´bocão´, dizendo tudo que sabe. O que queremos é justiça", contou uma parente da empresária.
Outra familiar de Jamile destacou que uma das amigas tem sofrido intimidações diariamente e acredita saber quem faz as ameaças. "Não foi ele (Aldemir) diretamente quem ameaçou, foi um amigo dele que sempre está no nosso meio, se passando de amigo do marido falecido da Jamile", afirmou, citando o marido da empresária, que morreu há dois anos, em um acidente.
Ainda segundo a parente, o homem em questão chegou a dizer para a amiga da Jamile que Aldemir pretendia comparecer à missa sem que ninguém visse. "Ninguém aqui vai fazer nada contra ele, o que nós queremos é justiça. A polícia e Deus, primeiramente, podem fazer justiça", contou a entrevistada, cuja identidade não será revelada.
Namorado negou agressões em carro
Ainda nesta quarta-feira, os advogados de Aldemir Pessoa Júnior deram a primeira entrevista a respeito da versão do suspeito sobre a morte de Jamile. Segundo Aldemir, a empresária havia se trancado no closet do apartamento, quando ele arrombou a porta e a encontrou com a arma na mão dizendo que ia se matar. Disse ainda que não conseguiu evitar que ela atirasse em si própria.
A versão de Aldemir também tenta explicar as imagens obtidas em câmeras de segurança que mostram cenas de agressão momentos antes do tiro. "Foi nos relatado pelo Aldemir que momentos antes ele tinha parado num posto de gasolina, e antes, nesse caminho, ela tinha tentado descer do carro. Ele teria puxado e a porta teria batido no rosto dela", contam um dos advogados.
Um outro momento registrado em vídeo parece mostrar Aldemir dando um soco na empresária, ainda dentro do carro. "O que ele nos relatou foi que ele estava tentando fazer algum gesto para ver aquela pancada que teria sido na porta do carro, no rosto dela", diz a defesa.
Defesa confirma que advogado limpou apartamento
Sobre a vantagem financeira que o Aldemir teria com a morte da empresária, os advogados dizem que ele não tem direito a nenhum bem, nem administra a renda de Jamile.
O suspeito já não estaria mais no apartamento dela e só não entregou a chave porque ainda tem objetos pessoais lá, mas deve fazer isso logo.
Os dois carros que a empresária tinha estão na garagem do escritório dos advogados, à disposição da família. A defesa nega que Aldemir tenha usado o celular da empresária quando ela ainda estava no hospital, mas confirmou que ele voltou ao apartamento e limpou o local onde ela foi atingida pelo tiro.
"Ele achava que aquilo ia passar, vamos dizer, quase que despercebido, ela seria socorrida, se salvaria, tava tudo certo, voltaria. Ele teve aquela esperança de não alardear, vamos dizer assim. Realmente ele limpou alguma coisa que tinha no chão. No outro dia parece que ele disse para a empregada limpar alguma coisa que tinha ficado, algum resquício, e pediu para que ela não mencionasse a ninguém, não falasse nada porque ele não estava pensando que ela fosse falecer e jamais imaginaria que pudesse acontecer o que aconteceu", dizem os advogados.
Tiro ´de cima para baixo´
O laudo cadavérico da Perícia Forense do Ceará (Pefoce) sobre a morte de Jamile obtido pelo G1 nesta quarta-feira (18), afirma que o tiro disparado contra a vítima "se deu de cima para baixo". No entanto, segundo o documento, o perito que realizou a análise não conseguiu precisar de qual distância foi efetuado o disparo.
No laudo solicitado pelo 34º Distrito Policial, da Polícia Civil, e concluído pela Pefoce no dia 3 de setembro deste ano, o perito detalha que foi "colhido e enviado para setor de balística um (01) projetil de arma de fogo encontrado na região do hipocôndrio direito, denotando que o trajeto deste se deu de cima para baixo, ântero-posteriormente e da esquerda para direita".
Ainda de acordo com o documento, Jamile morreu por uma "hemorragia intra-abdominal por lesão hepática por projétil de arma de fogo". O laudo indica que a tentativa dos médicos de salvar a mulher acabou por prejudicar parte da perícia, "não sendo possível determinar a distância do tiro pois o orifício foi modificado cirurgicamente".
Versões diferentes sobre atendimento
Os dois médicos que atenderam Jamile quando ela chegou ao IJF na noite do tiro também depuseram nesta terça-feira (17) e apresentaram versões diferentes sobre o caso.
Janio Cordeiro Barroso, médico plantonista da emergência do hospital, disse à polícia que a vítima afirmou ter tentado se suicidar. Logo depois da chegada dela à unidade, os técnicos de enfermagem afirmaram que ela não falava nada. Contudo, ela teria respondido o médico quando ele se aproximou. "O depoente botou a mão na cabeça dela e perguntou: ´O que houve?´; ela respondeu: ´Isso foi um tiro que eu mesma dei em mim´", consta no termo de depoimento de Janio Cordeiro.
O médico disse ainda não ter certeza se outro profissional do hospital ouviu Jamile dizer que tinha atirado em si própria.
Por sua vez, o cirurgião Jamil Zarur, também chamado a depor, afirmou que teve dúvidas quanto à versão da tentativa de suicídio alegada pelo namorado da vítima. O médico percebeu que a posição do ferimento era de um disparo vindo de cima para baixo, o que reforça o resultado do laudo pericial.
"Achei estranha a trajetória do projétil. Mas ela estava muito calma e geralmente quem tenta suicídio se comporta dessa forma, fica mais calada. Ela estava consciente, mas não falou nada", contou o profissional do IJF em entrevista à imprensa, na saída da delegacia em que prestou depoimento.
Enfermeira reforça hipótese de suicídio
Já o depoimento de uma enfermeira que atendeu a mulher no IJF, na manhã desta quarta-feira (18), afirma que Jamile teria dito, na Sala de Reanimação, que atirou contra si. Um médico do hospital já havia afirmado aos investigadores, na terça-feira (17), que recebeu a confissão da empresária.
"Ela chegou por volta de meia-noite, acordada, falando. Eu perguntei pelo nome dela e ela falou que era Jamile. Quando eu vi a lesão, perguntei se tinha sido um assalto, ela disse que não, que tinha sido ela", revelou a enfermeira, que preferiu não se identificar.
A testemunha também afirmou que Aldemir Júnior e o filho de Jamile, de 14 anos, estavam no hospital, mas não puderam entrar na Sala de Reanimação. "Ela continuou acordada, a gente continuou fazendo o atendimento, e ela continuou consciente do que estava acontecendo. O estado dela era gravíssimo. Depois, ela foi para o centro cirúrgico", completa.
O médico plantonista do IJF, Janio Cordeiro Barroso, o primeiro a atender a mulher, também ouviu a mesma versão de Jamile. "O depoente botou a mão na cabeça dela e perguntou: ´O que houve?´; ela respondeu: ´Isso foi um tiro que eu mesma dei em mim´", consta no termo de depoimento prestado pelo médico, no 2º Distrito Policial, na terça-feira.
Agressões eram comuns, segundo filho
Em depoimento, o filho de 14 anos de Jamile de Oliveira afirmou que as agressões do advogado contra a mulher eram comuns. Novos vídeos obtidos pelo G1, que podem ser vistos acima, mostram o homem agredindo a empresária dentro de um carro horas antes da morte.
O adolescente estava na residência no momento do disparo, mas se escondeu no closet ao ouvir barulhos durante a discussão do casal. Ele não soube precisar quem segurava a arma e quem foi responsável pelo tiro.
As câmeras de segurança registraram o adolescente carregando a empresária baleada junto ao advogado. Segundo a polícia, ele não é considerado suspeito.
Fonte: G1 CE
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