Em dezembro de 2019, o ministro do Desenvolvimento Regional,
Gustavo Canuto, em visita às obras do Projeto de Integração do Rio São
Francisco (Pisf), garantiu que no final do último mês de março as águas do
"Velho Chico" chegariam ao reservatório de Jati, no município
homônimo. "Até dezembro, aqui estará cheio. Daqui, seguirá para Milagres e
levará dois meses para encher. No final de março, ela correrá pelo Cinturão das
Águas do Ceará", detalhou o ministro, no reservatório de Negreiros, em
Salgueiro, estado de Pernambuco. O prazo, outra vez, não foi cumprido, e o
adiamento poderá ser superior a 45 dias.
O atraso decorre de problema que ocorreu na barragem de
Negreiros, localizada no município de Salgueiro, em Pernambuco. Técnicos, no
início deste mês, observaram a passagem de água para o solo, após fundação de
um dique em reservatório auxiliar. Há necessidade de bombeamento do recurso
hídrico para permitir o serviço de conserto na estrutura, após esvaziamento.
Em nota, a Secretaria Nacional de Segurança Hídrica (SNSH)
confirmou o problema, mas descartou dano estrutural no reservatório de
Negreiros. O sistema de monitoramento registrou, no início do mês, uma passagem
de água - percolação - pela fundação do Dique, que é um barramento auxiliar ao
reservatório em Pernambuco.
Ainda de acordo com a SNSH, uma vistoria técnica foi
realizada na estrutura e, logo após a ocorrência, atestou sua estabilidade, não
havendo riscos à população, aos trabalhadores nem ao patrimônio. "Desta
forma, foi possível retomar o bombeamento na estação EBI-3 em 4 de abril. As
águas do Projeto São Francisco já estão passando para o reservatório de
Milagres (reservatório em Pernambuco)".
O engenheiro Emanoel Carvalho pondera que, sem fotos e dados
técnicos, é difícil saber se este problema pode causar preocupação. No entanto,
explica que as barragens têm instrumentação de monitoramento. "Se estão
dizendo que não tem risco, é porque os monitoramentos não apresentaram
alteração". Com relação ao percolamento pela fundação, é uma situação que
pode ser grave, mas dependendo dos dados, o risco pode ser controlado. "É
como se estivesse vazando por baixo. Dependendo do nível de saturação, pode
ocorrer 'piping' que gere colapso na estrutura", completa.
O MDR prevê prazo de 45 dias para a execução dos reparos -
intervenção que será planejada de acordo com o cronograma de enchimento dos
reservatórios do Eixo Norte. "Considerando a estabilidade da estrutura, o
bombeamento segue 24 horas por dia. Equipes técnicas realizam o monitoramento
em tempo integral - conforme a previsão para empreendimentos com esse
porte", informa.
Nossa equipe de reportagem esteve, na última quinta-feira
(23), na barragem de Negreiros, em Salgueiro, e constatou que o volume da água
armazenada diminuiu. Segundo um funcionário, que pediu para não se identificar,
o nível que estava próximo da capacidade máxima do reservatório foi reduzido
por segurança, para serem realizados os reparos. Mesmo assim, como garantiu o
MDR, o recurso hídrico segue sendo transportado para a barragem Milagres, em
Verdejante, em Pernambuco, última grande estrutura antes de chegar ao Estado do
Ceará. Lá, ultrapassa a metade do percurso.
Esta é a segunda vez que o problema ocorre na barragem de
Negreiros. Em 16 de agosto de 2018, engenheiros detectaram vazamento no
reservatório. O risco de rompimento da estrutura, construída entre os anos de
2013 e 2015, assustou 35 famílias da Vila Produtiva Rural próxima, que foram
retiradas por segurança. O reservatório recebeu serviços em 24 horas, incluindo
injeções de cimento e argamassa, melhor solução encontrada por especialistas em
barragens.
Atraso
Grande preocupação segue em relação aos serviços
complementares, que vão levar a água da barragem de Milagres, ainda em solo
pernambucano, até Jati, no Ceará. Em dezembro, o MDR calculava um avanço físico
do Eixo Norte de 97,35%. De lá para cá, pouco mudou e, hoje, alcança 97,44%. Os
serviços não pararam, mesmo durante a pandemia. São 1.415 trabalhadores,
segundo o MDR. "Não houve redução nas frentes de serviço em razão da
Covid-19", enfatizou em nota.
No território cearense, constatamos que o número de
trabalhadores ainda é grande. Os serviços se concentram entre os reservatórios
de Milagres e Jati. De acordo com o MDR, restam 400 metros de obras
operacionais, de um total de 260 quilômetros. Das duas pontes sobre a BR-116,
entre Jati e Penaforte, apenas uma foi concluída. O Ministério ainda confirmou
que as chuvas registradas nas primeiras semanas de abril afetaram os serviços
restantes, que deverão ser finalizados apenas em maio.
O secretário Executivo da Secretaria de Recursos Hídricos
(SRH), Aderilo Alcântara, estima um prazo maior para a transferência de água
para o Ceará. "As informações iniciais que recebemos nos indicavam atraso
na transferência de água para o Ceará de três a quatro meses", observou.
Por ser uma obra federal e o problema ter se verificado em Pernambuco,
Alcântara preferiu não comentar o ocorrido.
O mesmo comportamento assumiu o diretor de Águas Superficiais
da Superintendência de Obras Hídricas (Sohidra), Antônio Madeiro Lucena.
"Vou evitar falar sobre o problema ocorrido em Negreiros", frisou. Lucena,
entretanto, confirmou que havia a expectativa de chegada da água do Velho Chico
ao Ceará para março passado. "Seria um período muito favorável, porque as
calhas de riachos e do Rio Salgado estariam cheias, favorecendo o escoamento da
água até o açude Castanhão", lamentou.
Cinturão das Águas
No lote 1 do Cinturão das Águas (CAC), quilômetro 11, no
município de Jati, Cariri cearense, algumas placas de concreto se deslocaram na
seção do canal no início deste mês. O problema foi confirmado pela Sohidra e
decorreu do tipo de solo e de infiltração de água de chuvas intensas na região.
"Já iniciamos as medidas corretivas. Porém, as precipitações
pluviométricas na região estão intensas e retornaremos logo que seja cessado o
período chuvoso no perímetro da obra", esclarece Antônio Madeiro Lucena.
"Foram apenas duas ou três placas que cederam. Um problema insignificante
para uma obra complexa e da dimensão de mais de 48 km de canais e túneis",
completou.
Ao todo, o Trecho 1 do CAC tem 64,26% de suas obras
realizadas. O lote 1 está com 95,94% de avanço físico e o 2 tem 96,25% dos
serviços concluídos. O chamado 'eixo emergencial' do CAC, que vai receber as
águas do rio São Francisco até o Riacho Seco, em Missão Velha, e daí por leito
natural até o rio Salgado, inclui os lotes 1, 2 e 5 e está com 98% de suas
obras realizadas. Já o lote 5 do Cinturão das Águas está finalizado.
Infiltração em barragem de Milagres, em Pernambuco, atrasa
chegada da água do Rio São Francisco ao Ceará. Governo Federal diz que
precisará de mais 45 dias para entrega.
Diário do Nordeste
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