Quando o mundo ainda contabilizava cerca de 80 mil casos de
covid-19 atualmente, superam 3,6 milhões, uma rede de cientistas brasileiros começava a se dedicar exclusivamente ao desenvolvimento de uma
vacina nacional contra o coronavírus. A reportagem é do R7.
Existem hoje duas pesquisas em andamento no país, com linhas
diferentes. A corrida é mundial, mas no Brasil, com 210 milhões de habitantes,
ter um produto fabricado aqui poderá representar também tranquilidade no
futuro, ao não depender ou depender em menor escala de importações.
Em São Paulo, cientistas do InCor (Instituto do Coração do
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP), sob a coordenação do
professor titular da universidade Jorge Kalil, iniciaram os trabalhos ainda em
fevereiro e agora já fazem os primeiros testes em camundongos.
A técnica da equipe do professor Jorge Kalil consiste no uso
de VLPs (virus-like particles, em inglês), que são moléculas que se assemelham
ao vírus, mas não possuem material genético para a replicação viral.
"A estas VLPs vamos acoplar pedaços do vírus que a gente
pensa que são importantes para o vírus se ligar às células humanas, que a gente
estudou. E aí, desencadear anticorpos contra essa parte vai fazer com que os
anticorpos bloqueiem a penetração do vírus na célula, que é o nosso objetivo
principal", explica Kalil, que também é diretor do Laboratório de
Imunologia do InCor, em entrevista ao R7.
Além disso, o grupo pesquisa também a resposta imunológica de
pessoas curadas, voluntários que tiveram a covid-19 e se recuperaram bem. São
analisados tanto o soro, que tem a imunoglobulina (anticorpos), quanto as
células.
"Você pode se defender do vírus com anticorpos, mas
também com células, chamadas células citotóxicas, que matam as células
infectadas. O que a gente tem observado é que nem todo mundo tem muitos
anticorpos neutralizantes. Acredita-se que essas pessoas que não têm os
anticorpos neutralizantes é porque o componente celular da resposta foi
importante também. Idealmente, vamos fazer uma vacina que tenha componentes
para gerar anticorpos, mas também para gerar células que sejam eficazes",
acrescenta.
Com toda a parte de "montagem" da vacina pronta,
agora se inicia a aplicação em camundongos, para ver se eles respondem com a
produção de anticorpos. Em seguida, serão utilizados camundongos transgênicos,
com um receptor chamado ACE2, que é por onde o coronavírus entra nas células.
"A gente vai imunizá-los e ver se, injetando o vírus,
eles não ficam doentes", detalha o professor.
Os próximos passos incluem estudos pré-clínicos em pelo menos
duas espécies de animais, para testar a segurança e verificar se a vacina não é
tóxica.
"Se tudo isso der certo, a gente vai propor à Anvisa
[Agência Nacional de Vigilância Sanitária] para começar os estudos em
humanos", diz Kalil.
Ele, no entanto, ressalta que não haverá no mundo uma vacina
disponível em menos de um ano em meio.
"Na melhor das hipóteses, um ano. Essa vacina, se nós
não tivermos a nossa, se for feita na Inglaterra, primeiro eles vão vacinar os
ingleses, depois americanos, depois europeus, depois chineses... Para nós
termos acesso a essa vacina, vai demorar. Tem que ter uma fábrica que produza,
tem que ter um monte de coisas."
180 Graus
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