domingo, 24 de maio de 2020

Economia do CE levará ao menos 2 anos para voltar a patamar pré-crise


Apesar do plano de reabertura econômica cearense não prever em quanto tempo as atividades voltarão à capacidade produtiva de antes da pandemia do novo coronavírus, especialistas consultados pelo Sistema Verdes Mares apontam que ao menos dois anos serão necessários para que a atividade retome o patamar de antes da crise no Estado e no País.

O projeto, ainda não apresentado pelo Governo Estadual, dividiu a reabertura em quatro fases, incluindo 12 setores primordiais para o reinício. O governador Camilo Santana informou ontem (23) a expectativa de que o plano comece a ser implementado no Estado em 1º de junho, se até o fim do mês se confirmar a tendência de estabilização dos casos de Covid-19.
De acordo com o diretor da Faculdade de Economia, Administração, Atuária e Contabilidade da Universidade Federal do Ceará (Feaac-UFC), Paulo Matos, esse prazo de dois anos para a retomada da economia no patamar de antes do coronavírus deve ocorrer "em condições normais", caso nenhum outro evento venha a atrapalhar a economia. "Até o fim de 2022, acreditando em anos normais, a gente conseguiria zerar a pancada de 2020", pontua.

Ele lembra que, para este ano, o Banco Central prevê que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro cairá mais de 5%. "E a economia cearense vai cair mais que a do Brasil este ano fatalmente, porque a economia do Ceará possui uma composição diferente, com um peso muito importante do comércio, do setor de serviços e do turismo", diz Matos, reforçando que esses três setores foram fortemente afetados.

"O turismo deve sofrer um baque permanente e vai precisar se reinventar. O turismo de negócios é um setor que praticamente morreu", avalia com preocupação. Para o economista, cabe ao Executivo estadual reforçar o trabalho de outras estratégias para uma injeção no perfil econômico do Ceará, além de garantir dependência menor de recursos da União.

"Nós precisamos atrair recursos da iniciativa privada de fora do Brasil. Temos que mostrar que o Ceará vai ser um dos estados mais juridicamente seguros para investir e prometer bons retornos. Quando a situação normalizar, quem prometer os melhores retornos e os riscos mais baixos vai atrair esses negócios. O que o Ceará precisa trabalhar é: mostrar que a gente prima por austeridade fiscal, que o Ceará é promissor".

De acordo com Jorge Lira, pró-reitor de Pesquisa e Pós-graduação da UFC, o plano de retomada elaborado pelo Governo do Estado trabalha com diversas possibilidades. "Nós, pesquisadores da UFC, e pessoas dos setores produtivos trabalhamos com cenários - mais prováveis, menos prováveis, mais leves e mais drásticos. Foram feitas projeções baseadas em evidências sanitárias e econômicas".

Lira afirma também que foi dada devida atenção aos problemas estruturais, como o desemprego, por exemplo, e a questões relativas à saúde e à educação. "A economia do Nordeste depende de transferência de recursos públicos. O que precisa retomar primeiro, em termos de estratégia? É mais fácil a gente pensar em não perdermos empregos e em manter o abastecimento. O retorno não é recuperar a capacidade produtiva, mas assegurar o mínimo de funcionamento das atividades", acrescenta.

Segundo Lira, a retomada da economia não depende só de um plano de reabertura, mas de vários fatores, como câmbio e desemprego. "Existe uma crise, e o plano não permite retomar como estava. Há questões aliadas à pandemia que vinham indicando crises sistemáticas no Brasil. A União já estava com baixa capacidade de investimento, por exemplo".

Setores

Segundo Augusto Albuquerque, pró-reitor de Relações Internacionais e Desenvolvimento Institucional da UFC, a construção civil foi apontada como um dos setores prioritários pela retomada devido ao grande impacto que tem na economia e ao menor risco de contágio pelo coronavírus.

"Eles já têm protocolos sanitários prontos. Assumiram não utilizar o transporte público. Nos chamou atenção porque, nessa época de elaboração do relatório, recebemos documentos desse setor. Eles já haviam feito benfeitorias nos canteiros de obras", explica.

De acordo com o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado do Ceará (Sinduscon), Patriolino Dias de Sousa, serão necessários até três dias para os canteiros se adaptarem para cumprir as novas normas sanitárias.

"Usaremos transporte particular ou vamos contratar ônibus ou vans para não haver contato entre as pessoas no transporte público. Todos vão usar máscara. A gente vai escalonar o horário de almoço, entrada e saída de colaboradores. Vamos usar termômetros nas entradas das obras, que terão ainda lavatórios e estações de álcool em gel, além de uma cartilha de orientação para os funcionários. E vamos fornecer kits sanitários para eles levaram para casa", explica.

Ainda não há um balanço do prejuízo das empresas da construção no Estado. Patriolino ressalta, no entanto, que muitas são construtoras do Minha Casa Minha Vida Faixa 1, por exemplo. "Algumas empresas trabalham nesse segmento. Outros trabalham para incorporação, que é o mercado quem vai dizer quando vamos retomar. Mas é fato que, infelizmente, já tivemos várias demissões. O mais importante é saber se os empregos serão mantidos a partir dessa reabertura", completa.

Energia

Na expectativa para o retorno das atividades, o Sindicato das Indústrias de Energia e de Serviços do Setor Elétrico do Estado do Ceará (Sindienergia) também preparou um plano com medidas preventivas voltadas aos trabalhadores do setor. Segundo Ribamar Carneiro, diretor executivo do Sindienergia, as medidas abrangem tanto colaboradores que atuam em atividades de campo como nos escritórios. Em um primeiro momento, o setor deverá voltar com 40% da força de trabalho.

Entre as ações, Carneiro destaca o distanciamento entre as pessoas, medidas de higiene pessoal, monitoramento de toda a força de trabalho, sinalização dos ambientes de trabalho e ações de comunicação com todos os trabalhadores, para capacitar e informar dos riscos associados à pandemia.

"Neste período de covid-19, o setor de energia distribuída (gerada pelo próprio consumidor em sua propriedade) tem sido o maior prejudicado, com equipes paradas, provocando uma instabilidade nas empresas", diz Carneiro. Das cerca de 60 empresas associadas, 70% são do segmento de energia distribuída, responsável por cerca de 2 mil empregos diretos no Estado.

A análise é endossada por Jurandir Picanço, consultor de energia da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec) e presidente da Câmara Setorial de Energias Renováveis. "O segmento de energia como um todo foi considerado essencial. A geração distribuída ficou mais restritiva porque o próprio setor está paralisado, e as casas das pessoas estão fechadas por causa do isolamento", destaca.

Couros

Na expectativa de voltar ainda na primeira fase, o setor de couros diz estar preparado para retomar as atividades. Segundo a presidente do Sindicato da Indústria de Curtimento de Couros e Peles no Estado do Ceará (Sindicouros), Roseane Medeiros, o segmento está totalmente parado.

"Embora a retomada vá ser lenta, até porque o mercado mundial está muito parado, isso já vai ser um recomeço. Obviamente, vão retornar os setores com menos riscos de contágio, e o industrial é de baixo risco. As empresas, desde o começo, elaboraram protocolos com muitos critérios e todos se preocuparam muito com a saúde dos seus colaboradores", aponta.

De acordo com Medeiros, as empresas estão preparadas para retornar, principalmente, as exportadoras. "A demanda mundial está muito afetada. A Itália é um grande player e já está retornando às atividade e entrando em uma certa estabilidade. No momento, não dá para sinalizar quando a gente volta ao normal em relação à demanda", pontua.

Tecnologia

Na contramão da maioria, o setor de tecnologia da informação e comunicação tem expandido durante a pandemia. Necessário para garantir as condições que permitem o isolamento social, como o teletrabalho, o segmento não parou de funcionar e tem registrado crescimento, inclusive com contratação de temporários.

"Aumentou a demanda por redes de internet, tanto por instalação quanto por manutenção. Temos conseguido atender de forma eficiente, inclusive temos recebido poucas reclamações dos consumidores", ressalta Pedro Alfredo Neto, presidente do Sindicato das Indústrias e Empresas de Instalação, Operação e Manutenção de Redes, Equipamentos e Sistemas de Telecomunicações do Ceará (Sindimest).

Segundo ele, já são cerca de 4,5 mil empregados no setor em todo o Estado e foram contratados mais 5% como temporários. "Esperamos que os que se destacam sejam aproveitados e efetivados quando passar esse momento".

Para Neto, a pandemia criou uma nova oportunidade de mercado e muitos negócios não deverão voltar ao modelo anterior como redução de gastos. "Mesmo com o retorno das equipes ao trabalho presencial, o que já implantamos não vai ser desfeito. Com a reabertura, a tendência é que fiquemos estáveis ou continuemos em expansão", projeta.

Fonte: Diário do Nordeste

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