Morreu nesta sexta-feira (29), em
um hospital particular de Fortaleza, vítima de Covid-19, o músico compositor,
cantor e violonista cearense Evaldo Gouveia. A informação foi confirmada pelo
biógrafo do artista, Ulysses Gaspar.
Autor de "Sentimental
Demais" e do samba-enredo "O Mundo Melhor de Pixinguinha",
dentre outras canções que ganharam espaço na memória dos ouvintes dos tempos
áureos do rádio até cá, Evaldo Gouveia teve sua obra bastante interpretada e
revisitada.
Conforme Ulysses, Evaldo estava
com a saúde debilitada desde o fim de 2017, quando apresentou um quadro de
pneumonia, em São Paulo. Na época, o artista se internou e no hospital teve um
Acidente Vascular Cerebral (AVC). De volta a Fortaleza, Evaldo ficou em
tratamento até contrair o novo coronavírus, que debilitou ainda mais seu
quadro.
Com 1.200 composições e cerca de
700 músicas gravadas, o estouro de seu repertório, na frequência radiofônica,
foi impulsionado pela voz de cantores como Altemar Dutra, Nelson Gonçalves,
Alaíde Costa e Maysa Monjardim. Antes de emplacar carreira solo, o cearense fez
parte de formações como a do lendário Trio Nagô, ao lado de Mário Alves e
Epaminondas Souza.
A relação com Altemar Dutra
(1940-1983), em especial, marcou o ápice da carreira de Evaldo Gouveia. O
cearense levou Dutra às boates de Copacabana, no Rio de Janeiro (RJ), e o
sucesso do cantor mineiro, interpretando as composições de Evaldo, levou ambos
ao auge.
Trajetória
Natural de Orós (CE), Evaldo
nasceu no dia 8 de agosto de 1928 e tinha a memória identificada com o
município de Iguatu (CE), para onde a família do artista se mudou quando ele
tinha apenas três meses de idade. O compositor é referência da MPB da era do rádio,
período que teve seu auge nas décadas de 1940 e 1950 no Brasil.
A consagração no Rio de Janeiro
teve sua base, no fim da década de 1940, na reputação de Evaldo Gouveia pelo
circuito de bares de Fortaleza e pelas premiações em programas de calouros da
extinta Ceará Rádio Clube. Foi depois dessa fase que o cearense ajudou a fundar
o Trio Nagô. Com o grupo, trilhou um amplo circuito de shows.
O trio fez sucesso no programa do
radialista César de Alencar (uma espécie de "Faustão" do rádio), na
Rádio Nacional (RJ). Nelson Gonçalves deu fôlego à repercussão de "Deixe
que ela se vá", música do Nagô. E nasceram, neste período da primeira
metade da década de 1950, composições como "Somos Iguais",
"Serenata da Chuva" e "Sentimental Demais".
Memória
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Evaldo ajudou a fundar o Trio Nagô, grupo com o qual trilhou um amplo circuito de shows. |
Ulysses Gaspar lembra que a
trajetória do conterrâneo inspirou a produção de livros e filmes. Em agosto de
2019, Gaspar escreveu "O que me contou Evaldo Gouveia", livro de
memórias do compositor, finalizado após mais de 400 horas de conversas
gravadas, entre Fortaleza e o Rio de Janeiro. A obra foi concluída em 2017, mas
o lançamento aconteceu apenas dois anos depois.
O evento, na Livraria Leitura, em
Fortaleza, marcou a última aparição pública de Evaldo Gouveia. "Além de
ser um grande compositor, ele era um grande contador de histórias. Tinha uma
lucidez tremenda e eu queria passar tudo para o papel. O maior desafio é que o
livro é como um filho: dá prazer, mas dá muito trabalho. O trabalho de escrever
e de pesquisar, porque foram pesquisas de coisas antigas. Se ele falava de Jair
Amorim, César de Alencar, precisava explicar para o leitor quem eram esses
personagens", detalha o autor.
Segundo ele, Gouveia tinha uma
memória impressionante e, durante o processo de apuração do livro, o papo entre
os dois chegava a durar sete horas seguidas. Cerca de cinco anos antes, o
produtor lançou uma caixa de DVDs intitulada "Grandes Nomes da Música Cearense".
No material, Gaspar reuniu documentários sobre a estrada de Evaldo, Fausto
Nilo, Fagner, Amelinha, Ednardo e Nonato Luiz.
"Foi muito gostoso de fazer
também, a edição trouxe imagens ricas e Evaldo me contou uma síntese da
trajetória dele. Desde o nascimento, a passagem pela vida artística, até os
dias mais atuais", complementa Gaspar.
Tributos
Recentemente, uma série de
tributos marcou as comemorações pelos 90 anos de vida do compositor,
completados em agosto de 2018. Em fevereiro de 2019, a homenagem do Carnaval da
Saudade do Clube Náutico Atlético Cearense sinalizou sobre a contribuição da
obra do cearense para os festejos carnavalescos.
"O Mundo Melhor de
Pixinguinha", em parceria com Jair Amorim, virou samba-enredo da Portela
em 1974, e Evaldo ainda criou as chamadas "marchas-rancho", a exemplo
de "Bloco da Solidão", celebrada nos bailes durante os anos de 1970.
O reconhecimento do apelo diverso
de suas composições se deu, ainda, pela homenagem recebida na programação
oficial do Carnaval de Fortaleza, em 2011. Como o parceiro Fausto Nilo,
homenageado no ano anterior, Evaldo foi lembrado e teve sua obra revisitada, na
ocasião, por 20 intérpretes nacionais e locais, com o lançamento do CD "Lá
vai meu bloco, vai".
Produzido pelo percussionista
cearense Pantico Rocha, o disco reuniu nomes como Elba Ramalho, Jane Duboc, Zé
Renato e Dominguinhos, pelo time nacional. E, dentre os locais, o próprio
Evaldo participou (com "Canto Cearense" e "Esquinas do
Brasil"), além de sua companheira, Liduína Lessa, Kátia Freitas, Marcus
Caffé, Waldonys e a bateria do bloco Unidos da Cachorra.
Show
O conterrâneo Marcos Lessa,
conhecido pelo Brasil desde o sucesso do programa 'The Voice', da TV Globo, em
2013, preparou, em setembro de 2018, um show dedicado à interpretação do
cancioneiro de Evaldo Gouveia.
Além de celebrar a amizade e a
parceria dos dois artistas - concretizada por meio de canções feito "Entre
o mar e o sertão", o tributo evidenciou como o legado de Evaldo, durante
mais de sete décadas de trajetória artística, foi periodicamente
"reinventado" pelas novas gerações.
Para montar o show, Lessa deu
espaço ao "clássico" e ao "novo" dentre as criações de
Evaldo Gouveia. O repertório trouxe a interpretação de canções como "O
Conde", "Bloco da Solidão", "Alguém me disse" e
"O Trovador", além de quatro canções inéditas do homenageado.
Fonte: Diário do Nordeste
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