Difícil não conhecer alguém que tenha sido impactado pela crise de redução da atividade econômica gerada pelo novo coronavírus. No Ceará, essa realidade foi medida por pesquisa do Instituto Opnus, a pedido do Sistema Verdes Mares. O levantamento apontou que dois terços das famílias (66%) no Estado registraram queda na renda mensal durante a pandemia.
E esse cenário não deverá ser revertido até o fim de 2020, com a recuperação dos níveis de renda acontecendo apenas a partir do começo do próximo ano, segundo especialistas consultados.
De acordo com a pesquisa, apenas 33% das famílias cearenses não registraram queda dos ganhos mensais, enquanto 29% dos entrevistados revelaram ter perdido metade da renda. As parcelas correspondentes às famílias que tiveram um impacto menor ou maior que 50% da renda foram semelhantes, de 16%. Já para o restante das famílias, 5% do total, houve perda completa dos recebimentos no mês.
Segundo o economista Allisson Martins, o cenário é um reflexo claro da redução da atividade econômica registrada em todos os setores, fazendo com que empresas tivessem o faturamento reduzido. Com resultados piores, muitas empresas demitiram ou reduziram salários dos funcionários durante a crise.
"A queda na renda é resultado desse quadro adverso em que a pandemia afetou a economia cearense como um todo. As perdas na indústria chegam a 22% no acumulado do ano, além de quedas de 18% no volume de vendas do comércio e um recuo de 12% no setor de serviços. Isso tudo gerou demissões e reduções de renda em toda a sociedade, afetando muito o mercado informal. Pesquisas apontam uma perda de até R$ 11 bilhões na economia cearense em 2020", disse Martins.
Impacto desigual
Contudo, a perda de renda não foi igual para todos. A pesquisa do Instituto Opnus também apontou que foram as famílias mais pobres que mais sentiram os impactos da crise. Aquelas que tinham renda de até um salário mínimo foram as mais impactadas. Nesta faixa, 78% indicaram perda de renda durante o período.
Entre as famílias com renda entre um e dois salários mínimos, 64% disseram ter tido redução de renda. Entre as famílias que ganham de dois a cinco salários, 46% tiveram perdas. Já para as famílias com renda superior a cinco salários mínimos, 41% indicaram ter impacto na renda.
Outro índice que indica essa diferença entre faixas econômicas é que 31% das famílias que recebem até um salário mínimo tiveram perdas de 50% a 100% da renda mensal. A proporção cai a 16% entre famílias que ganham entre um e dois salários a 12% para as que recebem entre dois e cinco salários; e a 2% para aquelas com renda superior a cinco.
O professor e coordenador do departamento de Economia Agrícola da Universidade Federal do Ceará, Jair Andrade, explicou que as pessoas mais pobres dependem muito mais da estabilidade do mercado de trabalho para garantir a renda mensal. Famílias mais ricas, segundo ele, possuem outras fontes de rendas, que ajudam a reduzir os impactos de uma crise como a atual. Ele citou investimentos, imóveis alugados, lucros empresariais e outras fontes de renda.
Andrade destacou, no entanto, que a pandemia não é a causa dessa desigualdade econômica. Ele lembrou que a economia brasileira já vinha em um ritmo lento, impulsionando a fragilidade do mercado formal. Com os impactos da Covid-19, essa movimentação foi acelerada. "A pandemia só potencializou esse cenário de desigualdade de renda. Os índices no Brasil têm aumentado desde 2016. Não aumentou tanto porque temos medidas de apoio como o auxílio emergencial, mas quando esses benefícios forem retirados, a pobreza irá aumentar".
Andrade também comentou que os índices de renda só devem ser recuperados em 2021. Segundo ele, mesmo com os planos de retomada, o mercado de trabalho é mais lento e dependerá do controle da pandemia. "Esse é um ano completamente perdido para o mercado de trabalho".
Orçamento
Para tentar lidar com esse cenário, a diretora do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças do Ceará (Ibef), Darla Lopes, afirmou que as famílias precisam repensar o planejamento financeiro para otimizar receitas e despesas.
Ela ainda recomenda que as famílias busquem fontes de renda extra. "É preciso pensar no que as pessoas estão precisando e o que eu posso ofertar nesse momento para ganhar mais dinheiro", disse.
Por: Diario do Nordeste
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