Muito embora os dados da área da segurança pública se movam de acordo com a organização das facções criminosas e das políticas implementadas pelas secretarias vinculadas à área, o ano de 2020 interrompeu uma trajetória de queda. Desde 2017, quando houve o boom dos Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLIs) - que englobam homicídios, feminicídios, lesões corporais seguidas de morte e latrocínios -, os dados vinham caindo paulatinamente.
Entre janeiro e novembro daquele ano, foram 4.679 crimes violentos; indo a 4.190, em 2018; e 2.052, em 2019. Agora, o ano vai findando e, com ele, os números voltaram a subir. Em igual período, foram 3.720 CVLIs relatados pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS). Tudo isto, ocorrido em um ano com complicações sanitárias, promovidas pela Covid-19, e corporativas, com o motim de parte da Polícia Militar, que resolveu cruzar os braços nos dias mais sangrentos já registrados na série histórica cearense.
Para a socióloga Ana Letícia Lins, da Rede de Observatórios da Segurança, o motim da PM foi um momento extremamente sensível e determinante na área da segurança pública. "Além dos conflitos durante os dias da paralisação os números apresentados em fevereiro se seguiram nos outros meses. Já existia a tendência, mas fevereiro foi o momento de reorganização da dinâmica da violência no Ceará", analisa a especialista.
RMF
Ela cita ainda os números altos de homicídios ocorridos na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), que foi palco de diversos conflitos entre facções criminosas.
Era de se esperar, contudo, que a pandemia, que isolou boa parte da população cearense em seus recintos, apresentasse diminuição considerável nos índices de violência. A socióloga lembra que, durante o período mais agudo das infecções e mortes por Covid-19, o alvo era a periferia de Fortaleza.
"O mapa das mortes por causa da Covid era também o mesmo onde havia mais homicídios. Os movimentos estavam em consonância. Acho que a crise sanitária acabou deixando mais nítidos alguns problemas estruturais", acredita Ana Letícia Lins.
A especialista lembra e ressalta o aumento desenfreado no número de homicídios de pessoas trans e o crescimento nos índices de mortes por intervenção policial registradas neste ano.
Em 2020, Mizael Fernandes da Silva, de 13 anos, foi assassinado dentro de casa. Um policial militar foi indiciado. Agora em dezembro, a SSPDS divulgou que uma chacina, ocorrida em Quiterianópolis, foi pratica por PMs. Para a socióloga, a violência policial é sintomática e precisa ser olhada com muito cuidado.
"Essa violência difere completamente dos outros casos, tem participação direta dos servidores do Estado, não é uma violência difusa, que pode atingir a todos ao mesmo tempo. Ela é direcionada para pessoas jovens, negras e moradoras da periferia", completa a socióloga.
Fonte: Diário do Nordeste
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